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assumido comentários considerados impróprios contra o empregador no Facebook 32. Neste caso, o Tribunal da Relação do Porto decidiu no sentido de considerar o despedimento como lícito apesar da prova estar sustentada numa publicação de uma rede social. Se calhar aqui, o fator surpresa está relacionado com a forma como aquele Tribunal lidou com o facto das redes sociais não poderem ser uma maneira de contornar comportamentos considerados como não legítimos. Daí que o caso teve um elevado impacto mediático. Assim, fazemos questão de citar expressamente este acórdão face à sua relevância. Com efeito, este tribunal decidiu que As redes sociais fizeram surgir novos espaços que não se reconduzem facilmente às tradicionais esferas que se alargam progressivamente à volta do irredutível núcleo íntimo de privacidade do indivíduo, o que adensa as dificuldades em traçar os contornos da privacidade que merece a tutela da confidencialidade, pelo que se torna necessária, para a caracterização de cada situação, uma cuidada apreciação casuística. Alinhamos na esteira desta decisão porque, como já vimos, a utilização das redes sociais já não é sinónimo de uma partilha íntima de informação entre, por exemplo, duas pessoas. Em determinadas circunstâncias uma partilha, por exemplo no Facebook, pode ter alcançar milhões de destinatários em todo o mundo de forma rápida. Este impacto dificilmente resultaria de uma conversa entre 3 ou 4 pessoas num café ou num banco de jardim. Para além disso, parece-nos que importa sublinhar que o Tribunal da Relação do Porto reforça que o grau de privacidade deve ser interpretado de acordo com cada situação concreta 33.
Ainda no âmbito deste acórdão, o Tribunal da Relação do Porto sustentou que não resultando da publicação em causa do trabalhador no Facebook qualquer“ expectativa de privacidade”, não poderia este invocar uma natureza privada e pessoal com vista a beneficiar da tutela prevista no art. 22 º do CT 34.
Por este motivo, transpondo este tema para a questão do impacto que a utilização das redes sociais pode ter na violação de cláusulas de não concorrência laborais, entendemos que tudo se vai subsumir à existência ou não de uma expectativa legítima de privacidade por parte do trabalhador. Acreditamos que a utilização de redes sociais para fins profissionais será quase inerentemente incompatível com uma expectativa legítima de privacidade.
Vejamos o caso dinamarquês já analisado. Os trabalhadores não atualizaram o seu perfil no LinkedIn com o objetivo da informação ficar registada para si ou para
32 Cfr. Ac. do TRP, de 08.09.2014, processo n º 101 / 13.5TTMTS. P1, disponível em www. dgsi. pt.
33 Como, aliás, entendeu igualmente o Western High Court quando procurou estabelecer uma relação entre a
atividade desempenhada pelos trabalhadores e os efeitos potencialmente impactantes nas relações pessoais. No citado acórdão, o TRP referiu ainda que“ é de fundamental relevância a ponderação dos diversos fatores em presença – designadamente o tipo de serviço utilizado, a matéria sobre que incidem as publicações, a parametrização da conta, os membros da rede social e suas características, o número de membros e outros fatores que se perfilem como pertinentes em cada caso a analisar –, de molde a poder concluir-se se na situação sub judice havia uma legítima expectativa de que o círculo estabelecido era privado e fechado”.
34 O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu no mesmo sentido num processo com factos semelhantes( cfr. Ac.
do TRL, de 24.09.2014, processo n º 431 / 12TTFUN. L1-4, disponível em www. dgsi. pt). De acordo com este acórdão, o trabalhador, por sua livre iniciativa, ao proceder a uma publicação no Facebook, não só quis deixar ao livre arbítrio dos seus“ amigos” de procederem conforme lhes aprouvesse na divulgação do conteúdo que publicou, como inclusive tinha em vista que através deles houvesse uma divulgação mais ampla, nomeadamente, aos“ amigos” dos seus“ amigos” uma vez que solicitou que o partilhasse. Deste modo, entendeu este tribunal que o trabalhador não podia ter qualquer expectativa de privacidade, já que deliberadamente nem a procurou preservar, pelo contrário pediu aos seus amigos para partilharem o conteúdo do post que publicou.
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