Direito e Informação na Sociedade em Rede: atas Direito e Informação na Sociedade em Rede: atas | Page 115
Também nos Estados Unidos se verifica uma ausência de preparação legal para
o advento da IoT. A FTC (2015) tem também vindo a abordar esta temática,
defendendo não só que os fabricantes dos dispositivos deverão ter no seu website a
política de privacidade aplicável aos dispositivos que fabricam, permitindo ao
utilizador o seu acesso fácil, sem prejuízo da utilização de dashboards claros e concisos,
quando o objecto utilizado assim o permita.
O potencial de recolha de dados que a IoT nos traz, faz surgir novos modelos
de negócio, intrinsecamente (e, arriscamos dizer, exclusivamente) focados na análise
e (pressuposto) no tratamento dos dados. É a chegada dos anglicismos que vimos
ouvindo cada vez mais no nosso dia-a-dia: data mining, data analytics, data brokerage, data
science… Em suma, é só escolher o termo que melhor se adapta a cada caso em
concreto, mas, no fundo, todos têm em comum a mesma ideia-chave: O uso dos
dados recolhidos pelos milhares de dispositivos digitais existentes no mundo para a
finalidade última de descobrir padrões comportamentais da colectividade e, em ultima
ratio, do indivíduo.
Os dados tornam-se, assim, uma verdadeira commodity, um activo fundamental
para os novos avanços na compreensão do ser humano e nas tentativas de padronizar
o seu comportamento. O que muitos chamam de Big Data, mais do que uma particular
tecnologia, é, na verdade, um novo paradigma, uma crença na possibilidade de criar
padrões, modelos ou estruturas através da análise de enormes quantidades de dados
(Barocas e Nissenbaum, 2014).
Este tipo de análise encontra-se já em implementação em alguns sectores de
mercado, como o sector de retalho, na banca, no marketing, entre outros (Miguel,
2015).
Um dos principais argumentos utilizados para justificar o tratamento destes
dados diz respeito ao facto de os mesmos serem tratados de forma agregada, não
individual e, por outro lado, anonimizada, permitindo a sua não identificação como
dados pessoais per se. Sobre o conceito de anonimização e as suas técnicas mais
comuns – aleatorização e a generalização - já o Grupo de Trabalho do Artigo 29º
(2014b) se pronunciou num parecer, em que conclui que estas técnicas são úteis e
ajudam a salvaguardar a privacidade, mas, por outro lado, na maioria das situações
ainda permitem que exista, ainda que de forma marginal, o risco de conduzir à
identificação do indivíduo.
Que papel para o consentimento nesta realidade iminente? Torna-se claro que
o titular dos dados perde o controlo sobre os mesmos quando estamos a falar de
inúmeras formas de acesso e recolha de dados – através do que colocamos nas redes
sociais, das pesquisas que fazemos, dos cookies que aceitamos, dos gadgets que usamos,
do facto de respirarmos tecnologia a cada dia que passa… Acrescente-se ainda que a
reutilização dos dados para diversas finalidades e a necessidade de recolher um novo
consentimento para cada um desses tratamentos, no panorama do Big Data, torna-se,
eventualmente, impraticável (Cate e Mayer-Schönberger, 2012).
103