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estabelecida pelo fabricante do objecto23 ou terceiro para cujas aplicações ou
servidores tais informações são encaminhadas?
E se estivermos a falar de um titular de dados estranho a esse objecto 24?
Será o consentimento livre quando, pela própria natureza dos objectos da IoT,
a falta de autorização para a recolha e tratamento de dados implicará a “destruição”
de grande parte, se não da totalidade, das vantagens e funções desse mesmo objecto?
Como vemos, são muitas as questões (não exaustivas), para as quais a legislação
existente não fornece, ainda, respostas claras.
Uma forma de “escapar” à exigência do consentimento seria defender que o
tratamento de dados no âmbito da IoT cairia sempre na alínea e) do artigo 6º da
LPDP, uma das formas de legitimação do tratamento por via da lei, que se traduz na
prossecução de interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou de terceiro a
quem os dados sejam comunicados. Sucede que tal legitimação de tratamento tem
uma restrição, na medida em que não será aplicável quando devam prevalecer os
interesses ou os direitos, liberdades e garantias do titular dos dados, conforme a parte
final do referido normativo. Como bem refere o Grupo de Trabalho do Artigo 29º
para a Protecção dos Dados (2014a), no caso da IoT, parece tratar-se de uma invasão
significativa do direito à reserva da intimidade da vida privada e da protecção de
dados, na medida em que se consegue ter acesso a dados (maxime os de saúde) que,
de outra forma, dificilmente seria possível.
Assim, voltamos à necessidade do consentimento, para que o tratamento no
âmbito da IoT seja legítimo. A dificuldade aqui está, principalmente, na forma como
disponibilizar a informação necessária para que o consentimento possa ser
suficientemente esclarecido. Como salienta Luis Filipe Antunes (2016), “Um dos
principais desafios da privacidade na IoT é desenvolver tecnologias em que seja
obtido o consentimento dos utilizadores de uma forma transparente e eficiente (…)”
(p. 56).
O Grupo de Trabalho do Artigo 29º (2014a) salienta o uso das políticas de
privacidade como forma de facilitar à obtenção de um consentimento válido, embora
alerte que estas deverão ser, tanto quanto possível, user friendly, não sendo
recomendável uma remissão para a política geral de privacidade. De todo o modo, o
Grupo de Trabalho reconhece a dificuldade de assegurar a informação necessária para
o consentimento atendendo ao próprio tamanho físico dos dispositivos que, muitas
vezes, torna incompatível o uso de dashboards informativos. Assim, para colmatar
eventuais insuficiências do consentimento, o Grupo de Trabalho entende ser de todo
o interesse que a informação obtida seja desde logo anonimizada, evitando-se, assim,
a sua qualificação como dado pessoal25.
Aqui, verdadeiro Responsável pelo Tratamento, como, aliás, o Grupo de Trabalho do Artigo 29º para a
Protecção dos Dados (2014a) também concluiu.
24 Pense-se, por exemplo, no grupo de amigos que se reúne em casa de um deles, equipada com uma smart TV.
25 E, bem assim, desde que não exista possibilidade de reverter essa anonimização.
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