JOÃO NEVES
num psicólogo e tudo, vê lá. Alguma vez permitirias isto?
Claro que não. Acho que foi o Bruno que lhe pôs algum
juízo. Não me livrei da chatice por uns tempos: a mãe sempre
a fazer-me perguntas incómodas, não me deixava ficar
sossegado no quarto, a pensar. Pensar, pensar a sério, é uma
dificuldade muito grande. Pelo menos para mim. Preciso de
estar sozinho, preciso de fixar os olhos num ponto no
horizonte, a mãe vê-me assim e diz-me tens de comer cebola
que faz bem ao pasmo, eu digo que não estou pasmado que
estou a pensar, se tu visses como ela abre os olhos, parece
que grita o meu filho a pensar, que mal fiz eu. O padre já aí
vem, as pessoas estão a levantar-se, parece que vai começar.
O Bruno está sempre a fazer sinais aos amigos, não sei se
levam isto mesmo a sério, a Filipa ajeita o Bruninho e faz um
daqueles olhares de reprovação que só as mulheres sabem
fazer, deve ser um ritual passado entre gerações em festas de
tupperware de fim-de-tarde, daquelas que a mãe ia de vez em
quando. Foi numa dessas reuniões que vi as minhas primeiras
mamas, ias ficar orgulhoso pai, as da Helena, sim, a amiga
da mãe, acho que tens inveja agora, confessa lá. A mãe tinhame mandado ir brincar para um quarto no fim do corredor e
eu, distraído, nem prestei atenção qual foi a porta de onde
saímos, quando ouvi a mãe chamar por mim para irmos
embora fui para o corredor sem perceber qual era a porta de
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