VÂNIA CUSTÓDIO
Nasceram na terra, vão ao café da aldeia, bebem vinho
na tasca, participam nas festas da colectividade e vêem os
programas do day e do prime time em televisão de canal
aberto. Conversam sobre as últimas intrigas dos reality
shows e têm opiniões sobre os temas quentes do Correio da
Manhã, que discutem alegremente com quem se aproxima da
mesa do pequeno-almoço. De vez em quando lêem e gostam
de falar sobre isso com gente que tem "mais cultura".
Enchem a boca para dizer que gostam de Dan Brown,
Nicholas Sparks, Miguel Sousa Tavares ou José Rodrigues
dos Santos, enquanto esperam um sinal de aprovação do
outro lado, a senha de que se entrou para um clube restrito.
Simples, as pessoas simples, acreditam que lêem os melhores
autores e mostram-no com a generosidade de quem espera
esse reconhecimento. Não distinguem o secreto torcer de
nariz das pessoas não simples, aquelas que já aprenderam
que isso não é literatura que se apresente, menos ainda que se
torne pública. Ai delas que algum dia o dissessem com esta
leveza nos círculos que se movem. Isso é para o povo, para as
pessoas simples.
Formadas em universidades das grandes cidades, ou
apenas com a escolaridade obrigatória, as pessoas simples
nunca perderam o cordão umbilical que as liga à terra onde
nasceram e às pessoas da sua origem. Movem-se num meio
restrito e pertencem a uma comunidade. Representam o
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