Contemporânea Contemporânea #12 | Page 6

Jogos Olímpicos de Paris 2024:

finalmente a igualdade de gênero?

Wagner Xavier de Camargo

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Muito se tem alardeado pela mídia, por meio de notícias jornalísticas e de opiniões de especialistas, que em Paris 2024 há a tão esperada “igualdade de gênero” na série histórica dos Jogos Olímpicos da Era Moderna, justamente na medida em que é a primeira vez que está igualado o número de atletas “homens” e “mulheres” participantes. Pelo que foi divulgado são 10.500 atletas, com o número de competidoras “mulheres” (50%) equiparado ao de “homens” (50%) nas arenas esportivas. Destaquei os termos entre aspas porque precisam ser melhor entendidos.

Ora, o primeiro ponto a ser desdobrado diz respeito ao esporte, que é dividido por categorias binárias de sexo, que retratam um suposto corpo sexuado segundo as normativas heterossexuais. E nos debates mais críticos, sexo e gênero não têm a ver, em que pese estejam interrelacionados. Assim, a questão que decorre desta é a que diz respeito à “igualdade” de gênero. Fala-se de “igualdade” entre gêneros reconhecíveis e legitimados, quais sejam, homens e mulheres cisgêneros. Em geral, corpos que, excetuando-se suas orientações sexuais, concordam com o que a sociedade lhes designou no nascimento. Portanto, sexo e identidade de gênero estão alinhados e são coerentes.

Então, o ponto crítico é exatamente este, isto é, na famigerada afirmação da “igualdade de gênero” não estão considerados homens e mulheres que fogem do script da cisgeneridade e da heteronormatividade: corpos não bináries (como Quinn, do futebol canadense), corpos trans (como Laurel Hubbard, do powerlifiting da Nova Zelândia), corpos com variação intersex ou mesmo corpos de homens gays e mulheres lésbicas, que se colocam como homonormativos e nem sempre estão dentro da cisgeneridade.

Apenas por estas explicações iniciais poderíamos parar este texto por aqui. Ou seja, para termos, de fato, “igualdade de gênero” entre atletas participantes teríamos que decompor mais o que se entende por gênero, orientação sexual, identidades, sexualidades. Mas vamos ainda dar continuidade a fantasiosa afirmação da “igualdade de gênero” para seguirmos na reflexão.

Mulheres e homens deveriam ter assegurados tratamentos e oportunidades equitativos, tanto pelas instituições quanto pela lei, independentemente de como se reconhecem e se entendem em termos sexuais e de gênero. No entanto, nem dentro da cisgeneridade os direitos são garantidos. A própria prática do esporte moderno, por exemplo, foi uma prerrogativa sempre garantida por/para homens (cisgêneros), desde o marco fundacional de Pierre de Coubertin, ao passo que restrições, decretos e proibições se impuseram longa e continuamente às mulheres (cis ou trans).

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