Contemporânea Contemporânea #12 | Page 31

31

JOGOS OLÍMPICOS

MALVINAS ARGENTINAS: UMA NOTA SOBRE UM PEQUENO FILME E UMA GRANDE PROVOCAÇÃO

(A PROPÓSITO DOS JOGOS OLÍMPICOS DE 2012)

Alexandre Fernandez Vaz

Em 10 de maio de 2012, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) recebeu Horacio González (1944-2021) para uma conferência no auditório de seu Centro de Comunicação e Expressão. Figura de proa na vida intelectual argentina, ele vinha respaldado por anos de docência universitária, uma obra sólida, a ativa intervenção no debate público de seu país e ainda pelo cargo que exercia, o de Diretor da Biblioteca Nacional. Esta é uma posição de muita relevância em uma nação que se orgulha do papel que livros e leitura têm em sua formação.

Horacio veio a Florianópolis para proferir a conferência Literatura e política: a partir de Malvinas. A atividade se inseria nos esforços de reivindicação argentina sobre o arquipélago localizado no Atlântico Sul, cuja disputa com a Grã-Bretanha (que as chama de Falklands) já dura quase dois séculos. Desde 1833 ele é território britânico ultramarino. Um ponto de extrema tensão entre as partes aconteceu em 1982, quando a ditadura que usurpara a Casa Rosada seis anos antes promoveu uma invasão militar às Ilhas, içando a bandeira do país na capital, Port Stanley, imediatamente rebatizada de Puerto Argentino. Apesar de o regime de exceção estar com sérias dificuldades (ele cairia no ano seguinte), o ato conferiu-lhe popularidade e sobrevida, uma vez que entrava em jogo um dos principais tópicos das fantasias nacionalistas locais. Minha avó materna, que nasceu e cresceu no Chaco, dizia ter aprendido na escola que “¡Las Malvinas fueron, son y serán siempre argentinas!” O ato desencadeou uma guerra entre os dois países, com a Inglaterra vencendo a contenda e obrigando Buenos Aires a comprometer-se que não mais recorreria ao uso da força para a retomada territorial.

A ferida ficou aberta. Para que se tenha uma ideia, quando no país vizinho a previsão do tempo aparece na TV, anuncia-se, para além das condições climáticas em cada região da porção continental, como elas se apresentam nas Malvinas (na temporada de verão não é raro que também se fale do litoral catarinense, contumaz destino de muitos turistas hermanos). A falta de cicatrização mantém a dor que segue movendo os argentinos em busca da soberania sobre as Ilhas. Foi no interior desta senda que a conferência de Horacio se desenvolveu. Lá pelas tantas, na agradável manhã de uma quinta-feira outonal, ele mostrou um vídeo breve (1) que, segundo classificou, era uma peça que chegava ao limite do que seria uma provocação.

Seu tema eram os Jogos Olímpicos que seriam celebrados naquele mesmo ano em Londres, pouco mais de dois meses depois do evento na UFSC.

Com um minuto e meio de duração, o curta-metragem é um produto publicitário feito por encomenda do governo argentino. Dele é protagonista Fernando Zylberberg, capitão da equipe nacional de hóquei sobre a grama que viajaria à capital da Inglaterra para as Olimpíadas. O filme abre com imagens de uma Port Stanley deserta, é de manhã e logo vemos

o atleta preparando-se para começar seu treinamento. Não faz calor e o capuz do agasalho é

posto sobre a cabeça, antes que a corrida se desenvolva por vários pontos identificáveis, tanto

das Ilhas em si mesmas – ondas marinhas, rochas, animais atlânticos – quanto da presença

inglesa sobre ela – o correio, a cabine vermelha do telefone público, a fachada de um pub.

Aqui e ali, exercícios e mais metros percorridos, mostrando muito esforço e dedicação, tudo

embalado por música que dá um tom entre o solene e o emotivo. Ao final, lemos na tela: “Para