Contemporânea Contemporânea #11 | Page 8

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mais novo e superior regime de práticas corporais, o esporte. Longe de ser uma questão de conquistar o gosto dos nativos, a política esportiva colonialista tinha por compromisso a aplicação das técnicas com vistas à urdidura de ecossistemas os mais parecidos com a civilização metropolitana. Assim, exortava Coubertin às administrações coloniais:

[...] Se quisermos estender aos autóctones dos países colonizados o que atrevidamente chamamos de benefícios da “civilização desportiva”, é necessário fazê-los entrar no vasto sistema desportivo de regulamentos [...] Diante desse passo decisivo, ainda recuam mais de uma administração metropolitana. Terão, portanto, que se decidir... ou os autóctones chegarão a se organizar sozinhos; e depois de tudo, talvez não seja tão ruim para eles do que para seus dirigentes (COUBERTIN, 2015, p. 696).

Este que é apenas um dentre os inúmeros exemplos que poderiam ser elencados e analisados aqui, não representa um cenário distante do contexto esportivo atual. Não será difícil encontrar membros de conselhos deliberativos de clubes recomendando aos seus colegas para que evitem contratar atletas pardos, posto que a referida “raça” teria um caráter degenerado (PIRES, 2019). Não me refiro apenas ao fato de que a interpretação da vitimização do racismo pelo esporte pode estar equivocada. Avanço mais alguns passos para propor que o esporte é e tem sido racista, uma vez que o racismo não se reduz a sua face mais visível e comportamental, mas é o conjunto de teses e discursos que orienta a forma como o esporte se organiza e concebe os corpos protagonistas da sua expressão prática. Racismo e esporte, por isso mesmo, não são apenas instâncias indissociáveis, mas se desenvolvem em reciprocidade, celebrando a manutenção da sociedade das hierarquias de classe, gênero e raça.

RACISMO NO ESPORTE

O fato de um horizonte diferente deste que aí está não se apresentar de modo mais claro ainda, não nos impede de recolher e apreciar indicações que nos conduzem a ele. Uma dessas indicações encontra-se na orientação providencialmente anticapitalista e anticolonial de Fanon (1968) acerca do esporte. Segundo o revolucionário franco-martinicano, o esporte comercial não deveria estar no centro de nenhuma sociedade vitimada pelo colonialismo. Nestas sociedades, o esporte também não deveria ser uma distração reservada à burguesia das cidades, mas uma plataforma a partir da qual as classes dominadas podem perceber a todo momento o que se passa à sua volta. Rebeldia, insurreição, (hiper)sensibilidade às opressões, revolução, são algumas das palavras que deveriam compor o seu regime discursivo e de objetivos, não em substituição às palavras paz e desenvolvimento, mas como elementos dos quais dependem os termos em destaque.

Nunca se escreveu e se enfatizou a “potência conciliatória”, “pacificadora” e “civilizatória” do Esporte como nos dias atuais. Da mesma forma que nunca se usou tanto as práticas esportivas como método de “educação”, “formação” e “desenvolvimento” dirigida às frações subalternizadas do planeta (MELO, 2011). Do esporte se espera até mesmo que consiga pacificar zonas de conflito, embora um simples exame da realidade concreta nos mostre que o inferno vivido por determinadas sociedades é condição necessária à segurança e desenvolvimento relativo das sociedades dos países centrais.

Ao essencializar problemas sociais externamente produzidos, a proliferação do discurso esportivo-civilizacionista, fortemente referendado por organismos internacionais e batalhões de ideólogos, se inscreve no circuito