Contemporânea Contemporânea #11 | Page 23

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“O futebol moderno,. como uma espécie de contrato social "perfeito", coloca, em tese, todos em pé de igualdade diante das regras do jogo”.

RACISMO NO ESPORTE

O Futebol moderno, como uma espécie de contrato social “perfeito”, coloca, em tese, todos em pé de igualdade diante das regras do jogo. O futebol é, assim por dizer, um tipo de ritual disjuntivo, pois, iguala para diferenciar. Historicamente, pretos e/ou pobres foram segregados do futebol dos grandes clubes, mas esse esporte rapidamente se popularizou, se profissionalizou e tornou-se parte da indústria do entretenimento. Com isso não pôde prescindir dos talentos oriundos das camadas populares. Além disso, os esportes, e o futebol principalmente, sempre fizeram parte de um mercado de apostas, assim, em muitos casos os preconceitos de raça e classe eram secundarizados em favor do desempenho das equipes. De fato, o alto desempenho é um dos principais valores da competição esportiva e configura a estrutura desse fenômeno. Desta forma, a seleção de talentos e virtuosos no futebol, independentemente da cor da pele, permitiu que negros e outras etnias localizadas na base na pirâmide social tivessem acesso a esse tipo de profissão, mesmo antes de sua legalização. Poder-se-ia perguntar: como um esporte que se populariza, permite mobilidade econômica para negros e/ou membros das classes populares, valoriza financeiramente o alto desempenho, está estruturado num contrato social, permite que agressões racistas apareçam aqui e acolá? Como jogadores negros que estão no topo carreira esportiva, se tornaram milionários e famosos pela competência técnica e física que apresentam nos gramados, ainda são vítimas de racismo numa sociedade de classes?

Como sabemos, as promessas das democracias liberais, que os indivíduos seriam medidos e recompensados por seus méritos e competências, independente da origem, cor da pele, do corpo, não se cumpriram para muitos grupos sociais.  Temos uma longa história de luta para que origem social, parentesco, religião e cor da pele não sejam adscrições que definam privilégios ou lugares dos indivíduos e grupos na estratificação social. Devemos ter consciência que a sociedade de classes não conseguiu romper com a estrutura de castas presentes no velho mundo. As estruturas de casta e de classe convivem em nossa cultura. Se economicamente pode haver mobilidade para negros, isto não significa que deixem de ser encarados como aqueles que pertencem às castas mais baixas na sociedade. Na estrutura de castas não há mobilidade, o status está definido no nascimento e/ou pela materialidade do corpo. Assim, as castas baseadas na cor da pele tomaram pretos, pretas como impuros, brancos e brancas como sinais de pureza e transformaram os corpos com cor, com matizes de cor entre os extremos em castas intermediárias. Isso significa que quando um negro está no alto da pirâmide intelectual ou econômica, a gramática da casta deve lembrar que ele está no lugar errado. Negros, mesmo com contas bancárias recheadas de dólares ou euros, não são poupados de diferentes constrangimentos no espaço público. Ser negro é ainda uma adscrição de perigo em nossas democracias liberais.