(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 87

Juremir Machado da Silva de que mudamos a sociedade e o mundo quando falamos muito sobre a sua situação. Esse legado impossível traz a marca de um novo ator essencial de maio de 68: o ‘povo adolescente’, composto por estudantes do ensino médio que foram educados e criados em uma nova sociedade de consumo e lazer com um novo hedonismo e a ideia de que tudo é possível. Como um famoso slogan dizia: ‘Eu tomo meus desejos por realidades porque acredito na realidade dos meus desejos’. Um slogan tipicamente adolescente. Vitória do capitalismo em sua forma espetacular, consumis- ta, adolescente, eis a herança de maio de 68 para Jean-Pierre Le Goff. O legado de 1968 na sua leitura é a transformação de praticamente todo adulto em eterno adolescente, cujos desejos devem ser satisfeitos a qualquer preço. Juvenilização do mundo, valorização radical dos desejos individuais como forma de promoção do consumo de objetos e de bens simbólicos dispensáveis, mutação do cidadão em consumidor, em suma, triunfo da mercadoria e solapamento da autoridade, do dever e de imperativos categóricos de comprimento com a mudança e a justiça social. Uma interpretação que pode ser vista como conservadora. Um novo maio é possível? Le Goff não vê a menor possi- bilidade: Por cinquenta anos, tenho ouvido: ‘Maio de 68 vai voltar!’ Mas as condições de hoje não são mais as mesmas. O messianismo revo- lucionário e a dinâmica de protesto de maio de 1968 morreram há muito tempo. O país está muito mais dividido. Também estamos testemunhando um aumento do comunitarismo, um problema inexistente em 68. Ainda existe um ‘esquerdismo cultural’, que se tornou ‘politicamente correto’, e está presente em certas mídias. Há um divórcio crescente entre um pequeno ambiente pós-1968, que vive umbilicalmente e as classes trabalhadoras, que são con- frontadas com desemprego em massa, novas formas de precarie- dade social, insegurança... A dinâmica dos trinta anos gloriosos e a visão de uma história de progresso rumo à emancipação foram substituídas pelo desemprego em massa e pela crise das grandes ideologias. O futuro, que não parece mais ser impulsionado por 86