(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 86

Maio de 1968: Balanço de uma Utopia Tudo parece estar aí: com que lente se via o acontecimento? Só não via a revolução quem usava os óculos da “Revolução”. De certo modo, os jovens “revolucionários” não estavam com- preendendo que uma revolução comportamental, com todas as contradições e limitações possíveis, estava em curso diante dos olhos deles e até, em algum grau, com a participação deles. Eles não estavam entendendo nada 2 . 2. Balanços depois de 50 anos Meio século transcorreu. A utopia da grande revolução es- maeceu. A União Soviética acabou. A China comunista transfor- mou-se num capitalismo de Estado. Cuba agoniza. O maoísmo e o trotskismo fazem parte da memória revolucionária do século XX a ser estudada em ciência política, em história e até em an- tropologia como traço de uma época revoluta. O que resta do maio de 1968 francês para Le Goff: Há uma série de progressos inegáveis: questionamento das hie- rarquias ossificadas, das burocracias, de um modelo taylorista do trabalho, uma maior atenção às condições de trabalho, afirmando a autonomia dos indivíduos e da sociedade, maior liberdade na relação entre os sexos... Mas o movimento de maio de 68 também caiu em excesso. A ‘revolução cultural’ de maio de 1968 produziu efeitos desestruturadores, passando da crítica do autoritarismo ao questionamento do princípio da autoridade, da crítica do moralis- mo ao questionamento da moral, da recusa de qualquer hierarquia e qualquer instituição, sinônimo de dominação e alienação ... A ideia de ‘ruptura radical’ foi acompanhada pela utopia de uma sociedade horizontal em estado de criação permanente, composta também de indivíduos igualmente autônomos, criativos e respon- sáveis, cujas relações seriam estabelecidas com toda a transparên- cia, em situação de uso da palavra de debate sem fim, com a ilusão 2 Em 15 de setembro de 1968, no Festival Internacional da Canção, vaiado ao in- terpretar “É proibido proibir”, canção feita sob os ventos do maio de 1968 francês, disparou no seu agora célebre discurso a sentença devastadora contra uma juventude dogmática: “Vocês não estão entendendo nada”. 85