(COM)POSSIBILIDADES:OS 50 ANOS DO MAIO DE 68 com-possibilidades_os_50_anos_do_maio_de_68 | Page 101
Pedro Antônio Gregorio de Araujo
Antes de haver o desenvolvimento do espetáculo, já na fase
inicial do capitalismo, pode-se observar uma decadência de
ser para ter, uma degradação. Já, contemporaneamente com
o espetáculo dominando, ter degrada-se ainda mais, torna-se
parecer: não importa mais ser algo, muito menos ter algo, o que
é importante é parecer algo. 27 No entanto, ao mesmo tempo
que o espetáculo valoriza o parecer, a primazia da visão, o es-
petáculo não pode ser visto a olho nu e identificado por meio
disto, o espetáculo se esconde em plena vista. 28 – o espetáculo é
autocontraditório, e esta é sua força principal: “O espetáculo é
absolutamente dogmático e, ao mesmo tempo, não pode chegar
a nenhum dogma sólido.” 29
2.4. Comentário de João Emiliano Fortaleza de
Aquino
De acordo com João Emiliano Fortaleza De Aquino, pro-
fessor de filosofia da Universidade Estadual do Ceará (UECE)
e da Universidade de Fortaleza (Unifor), em sua interpretação
do espetáculo em Debord, o teórico francês coloca no centro
de sua teoria do espetáculo a perda da linguagem comunicativa
direta, e junto a esta perda também ocorre a expropriação da
autonomia do sujeito: ambas as coisas ocorrem por causa da
extensão da forma-mercadoria para o campo da vida:
27 “A primeira fase da dominação da economia sobre a vida social acarretou, no modo
de definir toda realização humana, uma evidente degradação do ser para o ter. A fase
atual, em que a vida social está totalmente tomada pelos resultados acumulados da
economia, leva a um deslizamento generalizado do ter para o parecer, do qual todo
‘ter’ efetivo deve extrair seu prestígio imediato e sua função última.” (Ibid., p. 18).
28 “O espetáculo, como tendência a fazer ver (por diferentes mediações especializadas)
o mundo que já não se pode tocar diretamente, serve-se da visão como o sentido
privilegiado da pessoa humana [...] Mas o espetáculo não pode ser identificado pelo
simples olhar, mesmo que este esteja acoplado à escuta. Ele escapa à atividade do
homem, à reconsideração e à correção de sua obra. É o contrário do diálogo.” (Ibid,
grifos do autor).
29 Ibid., p. 47.
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