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Na prática, esses muros deslocariam o fluxo para outro local e de outras formas, muitas vezes em travessias perigosas. É o caso da morte de mexicanos rumo aos EUA. Todos os anos, centenas de pessoas morrem ao atravessar desertos de temperaturas extremas. Na Europa, milhares de refugiados cruzam o mar Mediterrâneo em embarcações precárias e ficam no meio do caminho: morrem ou precisam ser resgatados. Somente em 2015, ocorreram 3.771 mortes em naufrágios próximos a países europeus.

Os muros também podem ser metafóricos, e além do controle da fronteira, representam a divisão de ideias, uma divisão simbólica. É o caso da barreira que divide as fronteiras da Coreia do Sul e Coreia do Norte. Além de ser uma barreira física, o muro divide ideologicamente os países: o norte comunista, e o sul, capitalista.

Na Irlanda do Norte, a cidade de Belfast possui diversos muros, os chamados Peace Lines. São barreiras construídas nos anos 1970 e que serviram para dividir as comunidades católicas e as comunidades protestantes. Os conflitos religiosos ficaram no passado, mas os muros ainda estão em pé, com grafites estampados que lembra a história recente.

Essas edificações também podem trazer consequências psicológicas. Foi nos anos de 1970 que o psicólogo berlinense Dietfried Muller-Hegemann falou na “doença do muro”, expressão cunhada para explicar a situação das famílias que foram separadas pelo muro de Berlim, que separou a cidade em duas. Elas conviviam com fortes taxas de depressão, alcoolismo e violência familiar.

Para o sociólogo Zygmunt Bauman, o muro contemporâneo é o símbolo do medo. Segundo Bauman, em nossa época repleta de incertezas, tememos a violência urbana, as catástrofes naturais, o desemprego e o terrorismo. O sintoma desse medo seria a busca por sofisticados sistemas de segurança e cercas contra o perigo do estranho que mora ao lado. Mas a ameaça da violência constrange o cidadão: ao se proteger com os mais diversos aparatos, a sociedade ameaça. O sociiólogo acredita que o caminho seria a promoção de um maior diálogo e solidariedade entre os povos. “Precisamos construir pontes, não muros”, afirma.

O constante desembarque de refugiados na Europa e o crescimento da ameaça terrorista fizeram surgir novas barreiras. Os enclaves espanhóis de Ceuta e Melilla, na costa marroquina, estão cercados por barreiras que buscam evitar a a entrada de imigrantes vindos da África. Na fronteira da Grécia com a Turquia, se ergue o Muro de Evros, que separa o Oriente do Ocidente.

Na África, Ásia e Oriente Médio também surgiram novas barreiras. Recentemente, no Quênia, na Arábia Saudita e na Turquia os governos fortificaram suas fronteiras para impedir a infiltração de jihadistas vindos dos países vizinhos . Na fronteira da Índia com Bangladesh existe uma barreira de arame farpado de quatro mil quilômetros. Os indianos buscam isolar a nação economicamente emergente dos seus vizinhos mais pobres e de famílias muçulmanas.

Para alguns estudiosos, a construção de muros não resolve o problema dos fluxos migratórios no longo prazo. Ele seria um símbolo poderoso, mas que traz apenas uma sensação de segurança. “A única coisa que estes muros têm em comum é que são sobretudo cenários de teatro”, defende Marcello Di Cintio, autor do livro Murs, voyage le long des barricades.

Di Cintio acredita que a construção dessas barreiras não evitou a imigração ilegal, o tráfico de drogas ou ataques terroristas. “Eles dão uma ilusão de segurança, mas não uma verdadeira segurança”, afirma o pesquisador.