contrários ao seu povo. A segunda alternativa, o aumento de impos-
tos, iria contrariar os interesses da classe média e da burguesia,
mas iria reduzir o poder de compra, levar à recessão, o que, aliás,
um confisco da economia popular também provocaria. Se eu conheço
o Brasil, um aumento de taxas provocaria aumento da sonegação,
sem que houvesse um aumento proporcional de receita...
Nesse momento, o dr. Altenberg ficou com o olhar parado, um
leve sorriso nos lábios, como se estivesse lembrando antigas histó-
rias. Ele percorria túneis da memória. Todos ficaram esperando,
alguns riram, o homem era conhecido por suas distrações. Ele
continuou, no entanto, a falar:
– Eu tinha esquecido uma coisa: a privatização de empresas
estatais, especialmente das lucrativas, como os partidos de direita
vêm propondo há tempos e que os militares, por seu nacionalismo,
não fizeram, apesar de terem cedido espaço a empresas estrangei-
ras. Isso representaria uma entrada de dinheiro, como quem vende
um anel, mas não resolveria nada. A solução estaria em conter as
contas e aumentar a produção, contando com taxas cambiais
melhores. Mas isso é utopia.
O sexagenário passou a mão pelos cabelos grisalhos, deu um
suspiro como quem está demasiado cansado com o peso do mundo,
olhou para os presentes e continuou:
– A terceira alternativa prejudica diretamente os interesses dos
funcionários públicos, da pesquisa, da assistência médica, da
atividade cultural e assim por diante; indiretamente, prejudica a
todos os que poderiam ser beneficiados pela assistência social,
pelos resultados da pesquisa, pela ativação do patrimônio cultural
e assim por diante. Como essa última alternativa atinge o fator
mais fraco e pode beneficiar o capital, inclusive por lançar mais
mão de obra barata no mercado, como ela oferece o argumento de
que o governo está cortando excessos em benefício do povo, como
ela serve para enfraquecer o aparelho de Estado facilitando a
imposição dos interesses dos grandes investidores, é provável que
seja este o caminho preferencial. Como não há de solucionar a
crise, em breve será necessário conjugar elementos das diversas
alternativas. Se o Brasil, enquanto maior país da América Latina,
não consegue enfrentar os interesses do FMI, não se pode esperar
que os países menores possam. Há força militar e policial para
controlar qualquer rebelião. Seriam necessários vários anos de
superávit nas exportações para pagar a dívida, o que pode ocorrer
se houver valorização das commodities. Países pobres não têm
Utopia e realidade no socialismo de Estado
51