“Boa noite minha filha
Sinto-me muito feliz por poder contar um tantinho da minha história.
A vó, quando era criança, vivia em terras longes com minha família, um lugar lindo em meio à natureza.
Nessa época, já adorava colher as erva que usávamos como tempero no preparo da comida.
Eu gostava de ficar na cozinha com as pretas mais velhas. Lá eu via tudo que faziam e, quando me deixavam, ajudava pegando uma coisa aqui e outra ali.
Da caça e da pesca, eu não podia participar, porque me diziam que era muito perigoso e era trabalho para os homens.
Mas, um dia, me vi no cativeiro. Vou contar como isso aconteceu com a vó.
A Lua cresceu no alto do céu, todos se recolheram. Quando o silêncio cobria nossas mentes, uma explosão ensurdecedora atingiu meu povo. Ao recobrar a consciência, estava eu em uma caixa de madeira.
A caixa chacoalhava, me sentia enjoada, não sabia onde estava e tinha medo, muito medo.
Comigo havia vários irmãos de pele escura.
Depois de muito tempo, que não sei dizer o quanto, a caixa parou e começaram a nos tirar de dentro dela. Era tudo estranho, nunca havia visto nada igual.
Quem eram aqueles homens brancos? Por que eles eram tão bravos? O que tínhamos feito? Não entendia.
A chegada à praia foi emocionante. Ao pôr os pés naquela areia branca, quente, tão acolhedora, senti um pouco de alívio.
Por um momento, foi como se alguém tivesse olhando por mim, nunca me esqueci daquela sensação, parecia receber uma abraço da natureza.
O meu olhar buscava encontrar um irmão que falasse a minha língua, mas nada. Estava sozinha e isso me doía mais que as chibatas dos homens brancos.
setembro UMBANDA Saravá 24