e a menina que fui na
infância soubesse da
mulher que eu me
tornaria, ela teria sido
muito mais leve e
feliz. Meu nome é Joyce Fernandes, mas todo mundo me conhece como Preta Rara, apelido que ganhei da minha mão porque gostava de fazer coisas diferentes das outras garotas, como jogar futebol e brincar de carrinho. Nasci e cresci na periferia de Santos, litoral de SP. Minha mãe, que
trabalhou como
empregada
doméstica por
muitos anos, e
meu pai, que
ainda é carteiro,
criaram quatro
filhos: eu, que
tenho 33 anos; a
Raquel, de 30; a
Jaque, de 26; e o
caçula, Lucas,
que adotaram
mais tarde e
hoje tem 11. As
pessoas pensam que famílias pretas e pobres são sempre de mulheres sozinhas, mas não lá em casa. Nossa base sempre foi muito tradicional, unida e ligada à música. A gente colecionava discos de Alcione a Michael Jackson e eu os escutava para comer, lavar louça e estudar.
Minha primeira experiência como cantora foi aos 10 anos, quando minha mãe obrigou todo mundo a frequentar a igreja.
Entrei para o grupo de louvor e passei a entender mais sobre a parte técnica. Quando não estava cantando, estudando ou ouvindo música, acompanhava minha mãe no trabalho - uma situação bem comum para a maioria das filhas de empregadas domésticas.
Já nessa época, ouvia muita coisa que só fui digerir anos depois, como gente dizendo que eu estava predestinada a ser doméstica, que não podia brincar com as filhas das patroas ou que
tinha uma “beleza
diferente”. Queria ser a
Xuxa, mas era negra.
Queria ser a Mara, mas
não tinha cabelo liso. É
claro que essas
situações
influenciaram muito
na minha autoestima.
Na adolescência, me
juntei a um grupo de
meninas para fazer
cover de uma banda
gospel. Foi nessa época
também que comecei a
colocar no papel tudo o que tinha guardado até então por ser menina, negra, gorda e moradora da periferia. Fui transformando o que sentia em poesias rimadas.
Quando terminei a escola, resolvi juntar uma grana para fazer faculdade. Por isso, aos 18 anos, comecei a procurar emprego como vendedora em barraca de praia, quiosque de lanche… qualquer coisa! Mas não tinha experiência. Nem boa
GLAMOUR 9