culinárias “pela complexidade que eles têm”, como
diz. “Por serem mais líquidos, acabam fermentando
e desenvolvendo características únicas, de sabores
muito distintos. Já os usei em diversas receitas, de
entradas a sobremesas, como o mel de emerina em
uma salada de nabos para aportar acidez, até o mel
de uruçu amarelo em um prato todo de beterrabas,
combinando com o gosto mais terroso”, explica
ele. “Queremos mostrar que mel não é apenas
um produto de café da manhã”, afirma Basile. “E
que todo mundo pode usá-lo nas receitas que faz
em casa”, completa. Basile também defende que
isento, delicado que é, só faz mel se estiver feliz,
como costuma brincar. A ideia de “abelhas felizes”
diz muito sobre um método de manejo em que
os insetos são tratados. Assim como as chamadas
As abelhas precisam estar livres para
zanzar pelas flores que estiverem no
caminho e aquelas pelas quais prefe-
rirem – num movimento natural que
próxima de 35 graus, com o bater de asas. Com
essa ação, elas precisam trabalhar menos à noite e
podem desenvolver outras atividades”, explica ele.
Essa “liberdade” das abelhas resulta na produção de
méis silvestres, ou seja, a partir de uma mistura de
flores, e não monoflorais, como algumas regulações
exigem – como no caso de mel de laranjeira ou de
eucalipto. Isso é fundamental, segundo Villas-Bôas,
para termos uma diversidade de produtos que seja
um reflexo da variedade de espécies e climas que
temos em um país tão vasto. “Essa é uma questão-
chave em um momento propício, em um país em
que há um modelo bem pausterizado de produção
industrial de alimentos.” Para ele, é preciso que
nossa legislação – e o gosto do consumidor, claro –
seja aberta a todas as formas de beneficiamento do
mel, levando em conta a situação específica em que
cada produtor vive e as características de terroir e da
espécie de cada tipo de abelha. Só assim poderemos
ter uma prova (doce, às vezes levemente ácida...) do
farto patrimônio que esses pequenos insetos que
colhem o néctar escondido nas flores proporcionam
– especialmente ao Brasil, onde são ainda mais
diversos. E aprender que mel é sempre no plural.
proporciona a polinização das plantas.
galinhas felizes ou porcos felizes, que são na verdade
animais criados soltos e em concordância com seus
hábitos, as pequenas abelhas também são criadas
livres no seu ir e vir. “Isso inclui a manutenção das
caixas em locais fixos, já que somos contra a migração
em busca de floradas, que causa perda e desconforto
para as abelhas, e fornecimento de alimentos através
de pastos apícolas nas proximidades, com diferentes
plantas, para que haja fornecimento contínuo de
alimentos”, afirma. As abelhas precisam estar livres
para zanzar pelas flores que estiverem no caminho
e aquelas pelas quais preferirem – num movimento
natural que proporciona a polinização das plantas.
Mandaçaias gostam de arbustos, as jataís preferem as
flores rasteiras e pequenas, enquanto as ápis são mais
generalistas, apesar de buscarem as flores grandes
com mais frequência. “Nossas colmeias também são
colocadas sobre pedras, que retêm o calor durante o
dia e mantêm as caixas aquecidas durante a noite.
A colmeia é uma incubadora, e um dos trabalhos
das abelhas é a manutenção de uma temperatura
Quanto mais livres forem, mais doçuras trarão. Essa é também uma lição de respeito à natureza e suas
delicadezas
RAFAEL TONON é jornalista de gastrono-
mia e escritor e não cansa de se surpreender
com a riqueza da biodiversidade brasileira.
SETEMBRO 2017• vida simples