ARTIGO
ELEIÇÃO CRÍTICA E TROCA DE GUARDA
A
eleição desse ano não
deve ser encarada como
o elefante da fábula in-
diana apalpado pelos
cegos. De cada ângulo emergindo
retratos que embora pareçam plau-
síveis estarão como o de quem lhe
apalpou o rabo muito distantes de
descrever o animal. Para enten-
dê-la é indispensável classificá-la
corretamente. E isso podia ser feito
desde algum tempo antes. Ela não
seria uma disputa normal, mante-
nedora, cujos resultados são ante-
cipados com facilidade pela geo-
grafia eleitoral. Seria como foi, em
nível paradigmático, uma “Eleição
crítica”, conceito consolidado na
literatura de ciência política (Key,
1955; Lavareda, 1991; Schimidt,
2018), onde as mãos que empu-
nham o esfregão que dissolve os
alinhamentos eleitorais pré-exis-
tentes são o estresse de uma crise
econômica severa, exacerbada po-
larização ideológica e a emergên-
cia de “terceiras vias” consistentes.
Acrescentando-se agora a demo-
lição da legitimidade do sistema
político à esquerda e à direita pela
operação Lava Jato com respaldo
entusiasmado da mídia e o impea-
chment de Dilma Rousseff sequen-
ciado pela reprovação popular ao
substituto Temer.
Por Antonio Lavareda*
representantes dos reinos vermelho
e azul que por mais de vinte anos
se alimentavam do próprio litígio.
No primeiro, do eleitor sebastianis-
ta ansioso pelo retorno de Lula e
perplexo até as últimas semanas da
campanha, uma vez confirmada a
exclusão do ex-presidente seu can-
didato, Haddad, retomou a maior
parte do território, levando de rol-
dão Marina Silva e contendo a linha
ascensional de Ciro Gomes. O PT
escapou à substituição na guarda
da esquerda pelo impeachment que
interrompeu o desgastante gover-
no Dilma, responsável juntamente
com as revelações da Lava Jato pela
derrota acachapante que lhe sub-
traiu 60% das prefeituras em 2016,
varrendo-o das grandes cidades. Li-
derar a oposição ao governo Temer
marcado pela impopularidade foi a
chave para recobrar sua base. Não
obstante, obteve a menor votação
desde 1994. No reino azul o proces-
so foi mais dramático, tendo come-
çado bem antes da campanha.
“Eleição crítica”, conceito con-
solidado na literatura de ci-
ência política (Key, 1955; La-
vareda, 1991; Schimidt, 2018),
onde as mãos que empu-
nham o esfregão que dissol-
ve os alinhamentos eleitorais
pré-existentes são o estresse
de uma crise econômica se-
vera, exacerbada polarização Os tucanos chegaram a ela com a
ideológica e a emergência de imagem manchada pelo envolvi-
“terceiras vias” consistentes. mento na Lava Jato, incluindo seu
Todos esses vetores, com alta si-
nergia, entregando à indignação e
ao medo o protagonismo emocio-
nal da disputa. Nesse cenário foram
duramente atingidos os tradicionais
ex-presidente apontado como réu
pela Justiça. Para piorar, a partici-
pação no novo governo, do qual se
tornara parceiro no impeachment,
virou uma bola de chumbo de al-
gumas toneladas. Numa eleição em
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