Revista Sesvesp Ed. 132 | Page 15

A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ESTADO E O PARADOXO PÚBLICO-SOCIAL
O discurso recorrente de todas as ações governamentais evoca invariavelmente os interesses público e social como um foco . Todavia , o resultado daquelas mesmas ações tem se mostrado bem distante do foco pretendido . O segmento da Segurança Privada , que tem no Estado o seu mais preponderante tomador de serviços , percebe com clareza os reflexos dessa dicotomia .
A segurança patrimonial privada representa um segmento intensivo , empregador de mão de obra de baixa remuneração . Puderam-se acompanhar , nos últimos 15 anos , sucessivas convenções coletivas e alterações legislativas que objetivavam trazer ganhos e melhorias sociais às respectivas categorias envolvidas , em decorrência da pressão exercida por um período continuado de elevada taxa de emprego .
Diferentemente de outros setores , que podem tirar proveito da produtividade e / ou do valor agregado de racionalizações administrativas e soluções tecnológicas , as empresas de segurança , na condição de prestadoras de serviços terceirizados via alocação de recursos humanos , são meras repassadoras dessas elevações de custo e não tem como evitá-las , racionalizá-las ou diminuí-las , devem simplesmente cumpri- -las , sendo afetadas sempre na mesma proporção do aumento do custo direto .
Junto ao período da nossa análise , o Estado , em todas as suas esferas e poderes , vem igualmente procedendo a alterações na forma de licitar e contratar , com inter-

“ Com a Lei 10.520 , os órgãos públicos passaram a adotar o Pregão como modalidade decisória na contratação da prestação dos serviços de segurança ”. Eurípedes Abud ferência substantiva no segmento de serviços . Com a Lei 10.520 , os órgãos públicos passaram a adotar o Pregão como modalidade decisória na contratação da prestação dos serviços de segurança . A partir da Lei do Pregão , os envelopes contendo os preços passaram a ser abertos previamente e , após a classificação dos preços , do menor para o maior , é que eram abertos os envelopes de habilitação e qualificação técnica , até a obtenção do vencedor . Aos poucos , o Pregão Presencial foi sendo substituído pelo Pregão Eletrônico , que hoje admite inclusive a participação de microempresas e empresas de pequeno porte e representa a quase totalidade dos procedimentos licitatórios do segmento de Segurança Privada , gerando uma corrida visceral apenas na busca do menor preço e não uma seleção criteriosa de um bom fornecedor de serviços para o Estado .

Como subsídio à melhor apreciação dos reflexos dessas mudanças , cabe enfrentar , ainda que tangencialmente , a legislação sobre a terceirização no Brasil . Sabemos que na ausência de uma legislação específica a regular a terceirização no Brasil , a Súmula 331 do TST tem sido utilizada como a principal referência na regulação dos aspectos gerais que envolvem a prestação de serviços relativos às atividades de apoio aos setores público e privado . No dia 24 de novembro de 2010 , dentro do ciclo temporal da nossa análise perspectiva , a referida Súmula teve uma significativa mudança em face de decisão do STF sobre o mérito da Ação Direta de Constitucionalidade n º 16 . A mudança gerada afastou a responsabilidade objetiva dos entes públicos sobre a inadimplências trabalhistas dos prestadores de serviço , fixando condições para a sua caracterização .
Assim , os órgãos públicos licitantes , representantes do governo federal , estados e municípios , todos com fortíssimas restrições orçamentárias , alguns até mesmo falidos , hoje se sentem tranquilos em contratar pelo menor preço , mesmo que este menor preço ofertado esteja manifestamente abaixo do custo , ainda que o aspecto social esteja sendo ignorado .
Em suma , passamos um período fértil de mudanças que afetaram o segmento da prestação de serviços em geral , em especial o da segurança patrimonial privada . De um lado , fortes alterações que elevaram substancialmente os custos diretos dos serviços ; de outro , grandes mudanças nos procedimentos de licitação que fragilizaram a seleção adequada de bons prestadores de serviço .

MERCADO

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Hoje temos uma alta taxa de desemprego e o segmento da Segurança Privada é um dos contribuintes dessa elevação . Nas novas licitações que se sucederam ao longo da implantação do Pregão Eletrônico , foram-se proliferando empresas de comportamento inidôneo ( entre elas microempresas e empresas de pequeno porte ), com preços manifestamente inexequíveis e que meramente esboçam a prestação dos serviços previstos no escopo do edital . Da mesma forma , entre os vigilantes que remanesceram empregados nesta crise , uma parte significativa que atua para empresas nas condições descritas não consegue receber integralmente os direitos e benefícios sociais que as medidas governamentais objetivaram de início .
Como resultado , temos um número cada vez menor de empresas idôneas interessadas em participar de licitações públicas . Se tal tendência perdurar , até mesmo a difícil condição de responsabilização prevista no inciso V da Súmula 331 acabará por ser caracterizada , e ao governo recairá o custo dos erros por ele próprio cometidos . Enfim , temos o paradoxo estabelecido , pois não foram atingidos nem o interesse público e nem o social .
Resta , claro , que as medidas devem ser sempre tomadas gradualmente , após ouvidos os representantes de todas as parcelas envolvidas da sociedade . A terceirização dos serviços está em discussão legislativa e sua regulamentação representa um importante marco na flexibilização das relações de trabalho . É importante que a legislação aprovada e a sua implantação garantam a justa remuneração pelo governo aos prestadores de serviço e que destes possam ser cobradas suas efetivas obrigações . ■
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