THE DEEP
DIVEMAGAZINE.COM MARCH 2017
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Os batuqueiros nascidos livres em terras africanas e trazidos como escravos para as terras brasileiras eram provenientes do território que conhecemos hoje como Angola e Congo, dos povos de origem Iorubá e Daomé, dos povos Malesi e Hauçá e do grupo Banto – incluindo os congos os Quimbundos e Kasanjes, todos da África Ocidental.
Começa então o processo de cultura e aculturamento sem precedentes na história universal. Muitos fatores eram impeditivos para que este contingente da população africana se rebelasse.
As condições desumanas e de humilhação, a imposição da religião católica em detrimento de sua religiosidade ancestral, o trabalho excessivo até a completa exaustão, os castigos à base de punições físicas, as etnias diferentes e rivais dos povos africanos trazidos para cá, o total desconhecimento das matas onde foram escravizados, entre outros.
Neste complexo há um embrião sendo tecido e regado pela cultura africana, afrodescendente e negra. Essa cultura em formação também tem interferência da cultura indigna aqui presente no continente, a dos portugueses, asiáticos e europeus. Num processo de cultura e aculturamento.
A Cultura do Samba se desenvolve neste cenário amplo de cruzamentos culturais e sociais, num grande caldeirão da miscigenação e não deve e não pode ser apenas determinado como uma expressão musical, sob a pena de perder sua essência e suas origens.
Os batuqueiros são integrantes do processo e a cultura africana presente, as rodas e os terreiros sua afro descendência, e a cultura negra o processo de incluir e ser incluído com a miscigenação. É evidente que existem muitos fatores aqui não abordados deste processo, mas o descrito cumpre seu papel.
Fazem parte deste amplo território cultural popular que é o Samba, a manifestação musical, a coreográfica e dança, a poética, a religiosidade, a comida, instrumentos, indumentárias e vestimentas, vocabulário, a transmissão do saber e outros. De tal forma se fossem separados não existiria o Samba.
A realidade é que existem culturas que foram sendo incluídas pela longevidade e apesar de estarem ali, não são identificadas como tal, como no vocabulário, nos passos improvisados das passistas, nas mesas fartas de alimentos e bebidas dos pagodes e rodas de samba, nos fundos de quintais, na vestimentas, na poesia, na transmissão do saber. Fazemos e praticamos.
O processo faz parte da construção de nossa identidade cultural, e desassocia-lo é como perder parte de nosso corpo, é cortar parte de nosso saber e dizer que tudo está bem.
sambamentum
muito além de modalidade musical
Carlos J Fernandes Neto
26 Revista Samba Acadêmico Especial Resenha de Batuqueiros 19