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LiteraLivre Edição Especial nº 1
as palavras dela queimando como brasa a pele de João: “João, você me
desculpa? Você é o homem mais bonito desse mundo, João! Mas você é
ninguém e eu nasci pra ser rainha!” João nunca mais viu Ritinha, que foi
embora viver seu sonho de rainha. Afundado num tempo de angústias, João
sobreviveu e se esqueceu do homem, do luxuoso carro branco e das palavras
de brasa sopradas pela boca de Ritinha. Mas não pôde se esquecer dela, não
soube se esquecer dela. E Ritinha ficou ali, guardada no fundo dos olhos de
João, envolta nas plumas de um fabuloso carnaval, pairando sobre a face de
todas as coisas.
João está agora à beira da Lagoa Rodrigo de Freitas, enquanto um último resto
de madrugada se recolhe para detrás da carcunda das montanhas. E João a vê
pela última vez. É ela. É Ritinha, no seu abundante corpo de mulata, que sobe
à superfície do espelho d’água, requebrando as ancas no cerco dos
admiradores. É ela. Cravada nos olhos de João, dançando em torno de João,
buscando o corpo de João, naquele carnaval que não deveria ter fim. E João
não quer mais suportar, porque a saudade, gota a gota, enche o peito de João.
É ela. E João pensa que já não vale mais a pena, que aquilo já não é viver, é
arrastar-se, arrastar-se para o nada, porque para ele só existe o nada. É ela. É
somente ela. E João abre os braços, tal qual o Cristo Redentor sobre o
Corcovado, e se atira na Lagoa Rodrigo de Freitas para morrer afogado.
A morte de João Gostoso coube apertada numa curta notícia de Jornal.
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