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LiteraLivre Edição Especial nº 1
Bob Dylan: Inevitável Interseção Entre Lírica Musical E
Literatura
Gilmar Duarte Rocha
Brasília/DF
Sou suspeito em dizer que para mim foi mais do que justa a
premiação do Nobel de Literatura deste ano para o compositor, cantor,
poeta e escritor norte-americano Bob Dylan. A suspeição decorre do fato
de acompanhar a carreira desse músico e poeta desde o meu tempo de
adolescência, quando passei a colecionar seus discos e a acompanhar a
sua carreira, ou melhor, resgatar um fecundo legado que ele já havia
produzidos nos torrenciais, fecundos e caudalosos culturais anos
sessenta.
Como morava à época no interior da Bahia, no tempo em que a
internet ainda residia na cabeça de algum marciano, não era nada fácil
conseguir obra de artista ou escritor de vanguarda: tinha-se que realizar
autênticas peregrinações pelos centros urbanos onde se respirava algum
tipo de cultura.
Com a mudança para a capital, e o consequente envolvimento com
jovens colegas universitários também interessados em tudo que se
denotava novo e avant-garde, fui compreendendo, que, por trás das
baladas temperadas com blues, rock & roll e música americana de raiz,
existiam letras complexas, bastante distintas de tudo aquilo que
entendíamos como lírica de uma melodia. Havia fogo por trás daquela
fumaça intrigante.
Pois bem, após o anúncio da láurea deste ano, ponderei sobre um
depoimento do periódico católico L’Osservatore Romano acerca da
premiação: “... compositor de música popular não é literato...”.
O prestigiado veículo de comunicação do Vaticano talvez tenha as
suas razões em proceder tal asseveração. No entanto, cabe salientar que
Bob Dylan, cujo nome de batismo é Robert Allen Zimmerman, filho e
neto de judeus imigrantes russos, não é o primeiro melodista a ser
contemplado com o renomado prêmio. Rabindranath Tagore, músico e
poeta prosador indiano, já amealhou tal titulação na edição de 1913. E
não foi contestado por ninguém pelo que eu saiba.
Independente da polêmica do estereótipo, se compositor popular é ou
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