Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre - 6ª edição | Page 95

LiteraLivre nº 6 – novembro de 2017 notar certo investimento afetivo na relação do trio, uma partilha afetual que alicerça uma certa arquitetura social.Tarek é preso ao atravessar com Walter uma roleta de metrô. Ambos carregam tambores, estão juntos, mas Walter é um americano branco e Tarek um tipo não americano. Todas as tentativas de intervenção de Walter junto aos guardas são rechaçadas e ele é avisado para não se meter ou vai preso também. Os atributos de Tarek denunciam, obviamente, sua estranheza na sociedade americana. Embora Walter tenha características que podem ser percebidas como desejáveis e integradoras, o fato de estar ao lado de Tarek, procurar intervir para evitar o constrangimento e a prisão, são suficientes para colocá-lo do lado estigmatizado. O estigma espalha-se, respingando também naquele que está próximo e solidário. Daí a ameaça que Tarek representa, também para seu pretenso protetor.Começa a cruzada de Walter para libertar Tarek. Ele conserva, de início, a calma que lhe é própria. Visita Tarek na prisão, contrata um advogado especialista em causas de imigração, consola Zainab que está assustada e, finalmente, vai abrigar e proteger Mouna Kalil (Hiam Abbass) que, sem notícias do filho, empreende uma viagem de Michigan para Nova York. O tempo vai passando sem que Tarek seja libertado. Toda a insensibilidade do sistema demonstra a inutilidade dos esforços de Walter e as restritas informações concedidas às visitas são exasperantes. Tarek reclama com Walter das condições do centro de detenção, do isolamento, do silêncio sobre as razões de sua prisão e da falta de expectativas de ser libertado. O excluído não tem direito a voz, não se faz dele uma escuta, porque o estigma reduz o indivíduo àquilo que se convencionou chamar de imperfeição. A presença de Tarek nos Estados Unidos, sem documentação adequada, faz dele uma espécie de negação da ordem social. Uma vez que não cumpre as exigências para o convívio social legal e também não é reconhecido o seu direito de exercício de sua diferença. Agora, dentro de uma “instituição de sequestro”, como Foucault se refere às prisões. Formalmente excluído de uma sociedade onde habitava irregularmente, em nome da normalização é categorizado como ilegal, portanto, inapto ao convívio naquela sociedade. Assegurar a normalidade dentro do sistema é oposto ao desafio da diferença. Em que Tarek pode ser visto como uma ameaça social? Esta questão não se coloca, não é relevante. Dentro de um sistema de paranóia persecutória depois do 11 de setembro a xenofobia é o comportamento padrão.Mouna demonstra toda a determinação e dignidade em só aceitar, diante da insistência de Walter, o abrigo em seu apartamento. Ela 90