Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre - 6ª edição | Page 64

LiteraLivre nº 6 – novembro de 2017 - O beijo do papai! E ela pulava em meus braços, lascava um beijo na minha testa, nós dois ali na entrada da escola, atrapalhando os pais que entregam seus filhos e felizes, como éramos felizes! E, na hora de buscá-la, era um perigo. Eu, por causa do trabalho, chegava sempre uns minutos atrasado, quando praticamente todos os pais e mães já tinham levado suas crianças. Ao ver-me descer do carro, ainda do outro lado da rua, ela saía correndo e, se eu não ficasse esperto para ser mais rápido, atravessava a rua sem olhar para lado algum, tudo para receber meu abraço: “Saudade, papai!”, sorria e pulava em meu colo. E eu era o homem mais feliz neste mundo! Impossível segurar as lágrimas. Lembro-me de Toquinho e Vinícius, Cotidiano nº 2. Às vezes quero crer, mas não consigo, é tudo uma total insensatez. Sua imagem me aparece nítida: linda, a menina mais linda do mundo, seus olhos grandes e negros, os cabelos fartos e encaracolados, a inteligência, seus desenhos maravilhosos e sua preocupação com o meio ambiente e a raiva contra as injustiças deste mundo. Aí pergunto a Deus: "Escute, amigo, se foi pra desfazer por que é que fez?" Mas não ouço resposta, só ouço o eco de minha voz: ... se foi pra desfazer por que é que fez? ... por que é que fez? Sete dias se passaram. Fomos à missa, rezamos por ela, pedimos a proteção de Deus. Ao final, esperamos um pouco, procuramos Padre Paulo no salão paroquial. “Não fiquem assim”, consolou-nos, com aquela voz mansa, um abraço acolhedor. A mãe chorou, o irmãozinho estava mais consolado, o representante de Deus completou: “Eu tenho certeza de que onde ela está ela está bem!” “Não adianta vocês ficarem só lamentando, chorando o tempo todo! Peguem as malas, vão viajar, vocês não iam?”, aconselhou a avó, a que estava 59