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LiteraLivre nº 5
- Setembro de 2017
Leonora
Paulo Luís Ferreira
São Bernardo do Campo/SP
A ideia persiste, tenho que escrever sobre Leonora. Tantas vezes durante
este último ano tão penoso e vazio para mim... Preciso ocupar o espaço físico
de Leonora, dando-lhe um sentido maior. É necessário que se faça outro ser
dentro de mim. O rumor de suas palavras, durante a noite já não é o suficiente
para consolar meu espírito que sofre tantos sobressaltos. Sim, muito eu teria a
dizer sobre o modo de ser de Leonora. Embora tenda a acreditar ser muito
difícil falar sobre Leonora. Sua forma frágil e imperatriz de ser; seus devaneios
e sua mansidão, o pacato e o agressivo olhar. Creio então, desnecessário
salientar a dificuldade que tenho de formular conceitos, sejam eles quais forem
sobre Leonora.
Há nas minhas lembranças estranhos hiatos. Fixaram-se, ao mesmo
tempo, coisas insignificantes e extraordinárias. Depois vem um esquecimento
quase que total. E essas recordações aparecem-me sempre emaranhadas e
esmaecidas. Nada se organiza em minha memória. Daí o motivo de nada poder
escrever sobre Leonora. Pego seu retrato e olho-o com zelo, observo que meia
metade, um quarto daquilo que houvera sido, já está retraçalhado pela traça. E
percebo que não tenho mínima capacidade de escrever sobre Leonora. É
quando um grande remorso e uma dor tomam conta de minhas entranhas,
então choro convulsivamente a melancólica lembrança de Leonora. Nesse
instante imploro aos deuses que devolvam minha Leonora. Mas eles nada me
dizem como resposta. Eu sei desta impossibilidade, então volto a cair em um
pranto ainda maior e durmo numa inconsolável tristeza. E quando acordo estou
mais triste ainda e decido que escreverei de Leonora o que Shakespeare
escreveu de Desdêmona; Cervantes divagou sobre a Dulcineia Del Toboso para
o seu Quixote e Guimarães Rosa cantou de Diadorim e Riobaldo. Porque,
realmente, sou desprovido de talento para escrever sobre Leonora. Mal faço
anotações sobre sonhos exóticos, encontros impossíveis como os que tive à
meia-noite de amanhã. Em que sobrevoava o Monte Everest, içando Leonora e
sua carruagem de fogo, rebocada por 12 cavalos e suas 48 ferraduras de
prata, salvando-a do degelo movediço da montanha. Por isso tomarei outro
rumo. Tentarei descrevê-la naquilo em que fui cúmplice, como se um diário
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