Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 5ª edição | Page 45

LiteraLivre n º 5- Setembro de 2017
cartomante. Não há perigo, há o seguir normalmente nesse dia que está cinza e de tão cinza desperta o desejo de ficar no dentro só para poder olhar através de uma janela com seu vidro de cores e cores. Mas como até isso seria frio! Os vitrais precisam de luz! Ah, mas seria belo mesmo assim, olhar através da cor. Quem sabe esse cinza seja um vitral que logrou, vai saber. Ainda tem tempo, pode sentar e agora sim abrir o livro e passear o olhar em uma ou duas páginas. E se tudo movimento, seguindo seu rumo, o ônibus também. E quem nele está. Pelo vidro da janela, o embaçado a desfocar o cinza, vira apoio para a cabeça – lembrou-se da cena que vira enquanto esperava? E a mão pousada no caderno fechado. Suspiro. Depois da esquina, levantar-se e dar o sinal e esperar para descer e seguir. Feito, simples assim. Outros ônibus e transeuntes passam e seguem. Não precisa se apressar, pode até sentar-se e agora deixar a mão mover-se e abrir o caderno, pegar a caneta e rascunhar o que poderá esmiuçar. Sim, só encostar o guarda-chuva e pegar a caneta na mochila. Pronto. Começar como se já soubesse o que estava a pensar, para a mão não se fazer de rogada e seguir seu caminho em escrita. Escrita em folha tão branca, tão distante desse dia tão cinza! Branco que machuca a visão e faz, sim, a mão parar porque o olhar se fecha e desvia. Desvia e busca na janela véu de cores. Quanto tempo assim? O suficiente para tornar ao branco da página e seguir com a mão. Uma, duas, três linhas escritas e já não precisa mais. Registro feito, semente lançada. Fechou o caderno e guardou a caneta. Respirou. Dia cinza que se desmancha em noite sem estrelas.
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