LiteraLivre Vl. 2- n º 10 – Jul / Ago. de 2018
mestre da casa. Ele convidou os dois para ficar. " Não é o espaço que falta, mesmo que meu apartamento não é tão confortável ". Não havia comida, nem lenha para se aquecer. Tudo o que restava dos tempos melhores era aquele banco e, em um canto, um colchão de palha disforme que mesmo os percevejos desdenhariam. O homem sentou-se num canto, ele se lembrou da garrafa na mão, sentiu o bolso enchido pelo pão, que era para servir como seu jantar. Como poderia não oferecer aos hóspedes e não dividir esses recursos escassos? Ostensivamente ergueu a garrafa, para oferecer, pelo menos, um gole aos dois novos inquilinos. Eles aceitaram. O velhote tirou um gole, um gole só, limpou a boca grunhindo, com as costas da mão, e passou a garrafa para a mulher. Ela estava para aproveitar, quando um barulho repentino balançou a porta frágil. A mulher parou, colocou a garrafa para baixo( com cuidado, para não deixar o vinho verter). Na penumbra, uma silhueta gordinha apareceu pela fresta da porta. Parecia um rato grande cheirando o ar cautelosamente, à procura de comida e calor.
Ela não perdeu a oportunidade. Estalou em silêncio, como um gato. O roedor, surpreso, mal teve tempo de se virar, mas ele foi agarrado pela cauda. Um momento depois, a mulher estava-lhe batendo a cabeça no parapeito da janela. Não era um rato, mas um caxingui. Algumas libras de carne saborosa, a não dizer deliciosa. O velho pareceu recuperar-se. Ele tirou do bolso uma faca pequena e, com incrível habilidade, começou a esfolar a presa. Seus gestos revelavam a longa prática de comer pequenos animais: ratos, toupeiras e coelhos eram sua dieta predominante desde tempos imemoriais. " Saia!- ordenou-lhe a mulher- Não vê que está sujando?"
O velho olhou em volta e viu uma espécie de bandeja, jogada em um canto. Ele pegou e saiu. Voltou com a bandeja coberta com um guisado de carne fresca. O caxingui tinha-se transformado em alimento, apenas ficava por cozinhar. Em outro quarto havia uma lareira, talvez fosse a cozinha do passado. Perto do fogo, o homem tinha pegado ramos, madeira e jornais velhos. Era hora de a lareira reviver. Bolas feitas com folhas de jornais velhos, cobertas por ervas daninhas e, em seguida, acendidas, enquanto o dono da casa estava ocupado para deslocar o
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