Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre - 10ª edição | Page 90

LiteraLivre Vl. 2 - nº 10 – Jul/Ago. de 2018 Meia Hora Ernane Reis Gonçalves Carmo do Cajuru/MG Vânia, a secretária da escola chamou-me na sala de aula. — Telefone pra você. É o Samuel. Preocupo-me. A Fátima saiu de casa às dezoito horas, eu às dezoito e cinquenta. São nove da noite. Bom, mas a Maria Joana está com os meninos. — Alô! — Oi, pai! Quantas horas que o senhor vem? — Uai, filhinho! Agora mesmo! Olho o relógio na parede. Nove e cinco. — Agora mesmo é que hora, papai? Nunca gostei desse agora mesmo. Agora mesmo é pouco tempo quando a gente quer que seja pouco tempo, mas quase sempre é muito tempo. Agora mesmo nunca é já. — Filhinho, daqui a meia hora o papai vai, tá? Aí ele me complicou de vez: — Meia hora é quantas horas, hein, papai? Difícil. Como explicar a um sonolento garoto de cinco anos, saudoso, quem sabe, assustado, o que é meia-hora? O que é o tempo, esse bicho que tudo come? O que são trinta minutos? O que é minuto? Um minuto? Paro confuso um minuto. Ele insiste: — Hein, papai? Quantas horas que é meia-hora? – o Samuel nunca aceitou meias respostas. — É... sabe? É nem uma hora. É a metade, sabe? Ele estava impaciente. — Mas meia hora é quantas horas, hein, pai? Demora? Desespero-me. Os alunos estão sozinhos na sala, já ouço o barulho que começam a fazer. Titubeio, buscando nas coisas que o Samuel faz, algo de 85