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LiteraLivre Vl. 2 - nº 10 – Jul/Ago. de 2018
Manhã de Outubro
Angélica Neneve
Cornélio Procópio/PR
Quem o visse naquela manhã de outubro saberia que ele não estava bem, seus
passos irregulares marcavam a areia em um zig zag constante e desesperador:
ele já não podia voltar por onde viera. Seu rastro estava era constantemente
apagado pelas súbitas subidas da maré e ele já não era capaz de lembrar o
caminho de volta. Continuou, então, sua caminhada rumo a lugar algum, sempre
em frente.
A tempestade se aproximava cada vez mais, podiam possível sentir sua fúria na
força com a qual o vento os castigava. A praia rapidamente se esvaziou, apenas
um ou outro surfista corajoso o suficiente decidiu ficar para tentar pegar ‘a onda
perfeita’. O velho de cabelos brancos e ralos, porém, parecia indiferente ao medo
que a tempestade tentava lhe causar: andou por mais alguns metros e decidiu
que estava cansado demais para continuar. Sentou-se na areia já molhada pelos
primeiros pingos de chuva e esperou.
Podia-se ver ao longe, a dança dos raios por sobre o mar, o horizonte se escondia
na escuridão das nuvens. A paisagem mórbida combinava perfeitamente com
aquela manhã. Era, para muitos, o retrato do fim do mundo. Para poucas almas,
porém, aquela era uma beleza natural e incompreendida. Era assim que ele via
aquilo tudo. Uma peça encenada pela natureza pouco apreciada pelo público,
embora aclamada pela crítica. Aquela paisagem fazia-o lembrar de algo e, no
entanto, ele não sabia dizer o que era. A nostalgia encheu seu peito assim como
o ar salgado enchia seus pulmões. E ele pôde distinguir uma lágrima caindo por
sua bochecha em meio a vários pingos de chuva: se alguém o observasse
naquele momento não teria percebido.
A ressaca da manhã seguinte ainda assustava os turistas que mantinham uma
distância segura do mar. O clima um pouco mais frio do que de costume afastava
quase todos dali. Um casal em sua lua de mel resolveu não desperdiçar um só
dia, uma corrida matinal seria uma boa pedida para driblar o vento gelado. Já no
terceiro quilômetro, porém, sua corrida foi interrompida: o corpo gelado do velho
caído na areia de uma forma quase trágica desviou-os de sua rotina - quem
estivesse ali naquele momento teria entendido o choque que sentiram.
O corpo do homem foi rapidamente removido do local: aquele era um dos cartões
postais da cidade, não podiam permitir que corpos ficassem expostos ali como o
são em partes menos visitadas. Alguém comentou sobre o assunto em sua rede
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