Revista LiteraLivre 7ª edição | Page 56

LiteraLivre nº 7 – janeiro de 2018 Quando tudo conspirava contra o proclamado réu Agripino, eis que um menino desgarrava da mão da mãe e partia em disparada em direção ao presumível cadafalso, onde se encontrava o adiposo prefeito; o esmorecido médico e o malandro sentenciado. Era Firmino, que falava como uma girafa mas enxergava como um lince, e naquele momento postava-se exatamente em frente a Siracusa, apontando o dedo para a preciosa bengala do executivo municipal e meneando os pequenos artelhos da mão esquerda de forma alternada e sucessiva. “Raios”, exclamou o prefeito fanfarrão. “A mãe desse fedelho pode tirá-lo daqui imediatamente”. Belisa não titubeou e acorreu para resgatar a sua cria. Quando ela puxava o inquieto garoto pelo braço, eis que o médico Gerônimo se ingeriu e perguntou a uma atônita Belisa: “O que o garoto queria dizer com os sinais, senhora?”. Ela ficou surpresa com a indagação, sinalizou que não iria se pronunciar e, para espanto geral, voltou atrás e respondeu ao médico de chofre: “Ele dizia que foi a bengala do senhor prefeito que atingiu a moça morta por trás”. Exclamação geral da audiência. Alguns levaram as mãos à boca; outros arregalaram os olhos; doidivanas desdenhavam. O médico não. Resoluto tomou o garoto de rompante das mãos da mãe e pediu que ele fosse mais explícito (nesse ponto, o médico se esforçava para isso, pois não entendia a linguagem de sinais). O menino, vivaz e inteligente, voltou a menear os dedos agora de ambas as mãos. “Traduza em nome da lei, minha senhora”, exigia Gerônimo, cada vez mais convicto de havia ali algo a desvendar. “Ele disse que há uma lança na ponta da bengala do prefeito”, traduziu a atormentada genitora. “Ah, ah, ah, ah”, o vão Siracusa depreciava o insólito testemunho da criança em tom de escárnio, emendando “Esses meninos hoje em dia andam lendo muito gibi; que imaginação fertilizada”. Depois, alterou o semblante e esbravejou com Belisa: “A senhora e esse mudo dos infernos me respeitem, 51