Revista LiteraLivre 7ª edição | Page 45

LiteraLivre nº 7 – janeiro de 2018 Num instante foi dominado por estranhos acontecimentos: Sob uma lua brilhante,em volta da fogueira numa ampla caverna, desesperado, entre gritos e urros, ele e seus pares arremessavam paus e pedras contra aqueles animais famintos, tentando espantá-los para proteger os membros de sua tribo. Logo em seguida, jogava uns ossos, já descarnados, como recompensa aos companheiros de caça que haviam propiciado alimentação à família. E esta atitude, tão comezinha nos dias atuais, pareceu-lhe um verdadeiro ato de bravura e heroísmo naquela época ancestral. Ainda sob o impacto de seu primeiro sonho, numa antiga casa, num outro país, testemunhou o autor da história arrancar com o canivete o olho de Plutão e, em seguida enforcá-lo numa árvore do quintal, fato que o incentivou vivamente a retornar o quanto antes à leitura daquela coletânea para conhecer- lhe o desfecho. Por fim, na alcova de um lupanar, de uma cidade interiorana, angustiou-se ao ver um homem esbofetear sua amante, xingando-a de “cadela”, depois que ela confessou esperar dele um filho – justo ele, um homem infértil. Foi somente com seu último e suplicante grito de “socorro” que ele finalmente despertou, e um tanto grogue e confuso, ficou a conjecturar sobre as possíveis causas daquela tragédia. Só então, ao se deparar no chão, com a esposa estrangulada por meio da guia do cãozinho e o filho, quase lúcido, a seu lado perguntando entre lágrimas: “porque ?” é que percebeu uns olhos esbugalhados, ferozes, ensandecidos, como os de um monstro,a fitá-los, ameaçadoramente, num canto da sala. 40