Revista LiteraLivre 3ª edição | Page 37

LiteraLivre nº 3 Corte “Americano” Regina Ruth Rincon Caires Campinas/SP No início da década de 1970, para tirar o sossego dos pais dos garotos, a moda era cabelo longo. Aloísio, embodocado na timidez dos seus treze anos, filho mirrado de um negro e de uma cabocla, órfão de pai desde que nascera, vivia com a mãe e mais um irmão. Meio carapinha, ele dormia todas as noites com a cabeça enfiada numa velha meia para tentar driblar a rebeldia dos longos cabelos. Quando acabava de lavá-los, com a velha tesoura aparava as pontas daqui e dali, ritual que fazia escondido, longe dos olhos da mãe e do irmão mais velho. Os dois não aprovavam aquela profusa cabeleira que deixava Aloísio com o semblante ainda mais franzino, disforme. Era uma cabeça desproporcionalmente volumosa sustentada por um corpo minguado. Imagem triste. Certo dia, Paulo, seu irmão, ofereceu-lhe, de presente de aniversário, um corte de cabelo na barbearia do Seu Alípio. Aloísio ficou todo cheio! Cortar o cabelo numa barbearia era artigo de luxo. Desde que se dera por gente e até certo tempo atrás, seu cabelo sempre fora cortado pela mãe. Sairia da barbearia todo faceiro, cheirando a álcool, a talco ou à água velva! No dia combinado, Aloísio recebeu uma cédula de dinheiro do 31