Revista LiteraLivre 2ª Edição | Page 61

LiteraLivre nº 2 arroz com feijão, churrasco e salsichão. Mampi assumiu o posto de bebê da casa; um ser que exalava amorosidade nas sobrancelhas arqueadas, com manchas brancas adornadas pelos olhos cor de mel e alegria no rabo acelerado ao festejar a família. Ela trocava olhares profundos com o cachorrinho, ficava imaginando os pensamentos daquela criaturinha de Deus. O marido não a olhava daquele jeito; só quando bebia e queria cuchi cuchi − desdenhou. O gurizinho cresceu, e Mampi envelheceu. Na verdade, já nasceu velho, com a sabedoria de quem tem compaixão por todo o tipo de gente. Bento transformou-se num adolescente retraído, cibernético, um replicante de Blade Runner. Usava o termo “legal” em profusão para denominar o que gostava, não gostava, ou achava mais ou menos. A palavra o mantinha unido ao mundo dos adultos, principalmente ao da mãe. A tudo o que ela perguntava, ele formatava no disco rígido e emitia um simples “legal”. Por sorte, o universo Mampi permaneceu intacto: bastava receber os refestelamentos do Mampituba para se abrir em sorrisos e gracejos. Mampi possuía esse poder. Saiu para caminhar, para fazer vento. Sentiu saudades dos passeios, das amigas e seus maridos beberrões. O marido dela também foi caminhar, para sempre. Teve que admitir, Idalcir enchia a casa de barulhos; não precisava de grandes motivos para as churrascadas com a turma do busão. Ele bem que tentou: – Quero envelhecer contigo. 55