LiteraLivre nº 1
A dona do verbo
Francine S. C. Camargo
Vinhedo-SP
Era uma vez uma garotinha que não se fazia entender por palavras. Isso mesmo.
Emitia o som em porte adequado, desfrutava de acertado vocabulário, pronunciava-se em
relação a qualquer assunto, falava mesmo pelos cotovelos e discutia, muitas vezes, com
a própria imagem ao espelho. Mas, curiosamente e ninguém sabia explicar o porquê, não
se podia compreender o que ela dizia, por maior que fosse o seu entusiasmo ou a
disposição e empenho do interlocutor.
Apesar desse detalhe quase irrelevante da falta de comunicação, ela continuava
senhora de si e expressava-se da maneira como conseguia. Experimentava verdadeira
paixão pelos vocábulos, enxergava letras no ar e tentava apanhá-las, em fantasia, para
formar seu nome. É fato que preferia o A e o M, tinha certo medo do Z e do H e ria-se toda
quando o I ensaiava sair de sua boca.
Complicado era decifrá-la quando seus olhinhos aflitos algo solicitavam, quando
esperava por uma resposta. Chorava um pouquinho, mas em seguida, novamente um
turbilhão de frases saía de si, para talvez um dia fazer sentido.
Muitas vezes, solicitou à mãe que comprasse a ela uma nova voz ou algum chá de
entendimento no mercado, na loja da esquina, no centro da cidade, na loja online da
China. Não era possível, em algum lugar deveria haver a sua solução em troca de
algumas moedas! Mas sua mãe não achava em parte alguma.
Até que em um dia, a menininha se enfastiou e resolveu parar de falar, se é que de
fala podemos chamar a sua constante tentativa frustrada de conversação. Cerrou os
lábios, cruzou os braços e negou-se a ser a pseudo-tagarela de antes. Todos,
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