Revista LiteraLivre 19ª edição | Page 81

LiteraLivre Vl. 4 - nº 19 – Jan./Fev. de 2020 Gracielle Torres Azevedo Maceió/AL Um nó na garganta na Enfermaria Oncológica Naquele dia eu acordei às 5horas, amamentei meu filho, brincamos um pouco e vim trabalhar com o coração na mão por tê-lo deixado chorando com minha partida. Ele tinha um ano e quatro meses, exalava vida, descobertas e novidades e sofria quando nos separávamos para eu ir ao trabalho. Eu explicava que o meu trabalho era ajudar a minimizar sofrimentos das pessoas. Eu exclamava o quanto isso era sensacional! Eu ajudava pessoas e ainda ganhava dinheiro para isso! Ele no auge dos seus 16 meses, parecia entender, mas me dizia em seu pranto, que nada justificava a minha ausência. Assim, eu saía para trabalhar, com o coração apertado de saudade. Enquanto dirigia, eu refletia sobre saudade, crescimento, desenvolvimento infantil. Eu refletia sobre vida e amor. Meu filho era a personificação da alegria do viver. Adentrei o hospital e fui ao serviço de oncologia onde trabalho. Eu vivenciava o paradoxo da vida. Trabalhava diminuindo sofrimentos de pessoas à beira da morte. Nas enfermarias da oncologia a morte parecia sempre estar à espreita. Em alguns dias parecia ter tirado folga ou se ausentado para um café, mas quando menos esperávamos ela surgia com ares de quem finge surpresa. Hoje ela veio visitar o Sr. Braz. Era um tumor de tireoide que apertava o pescoço, como a personificação da expressão nó na garganta. O tumor tinha uma rápida progressão e já não havia nada que poderia ser feito para ele regredir. Sr. Braz era tranquilo, esguio, de energia leve e serena. Fazia um sinal de legal sempre que eu me despedia após a conduta e o agradecia. Sr. Braz era paciente e tranquilo. Parecia esperar a visita dela sem pressa e sem ansiedade, como quem tem a certeza de que ela chegaria. [78]