Revista LiteraLivre 19ª edição | Page 71

LiteraLivre Vl. 4 - nº 19 – Jan./Fev. de 2020 Etelvina Manuel São Gonçalo do Sapucaí/MG A revolta dos peões O Rei Branco chegou todo imponente e posicionou-se na sua devida casa ao lado da Rainha a peça mais importante do jogo, claro, depois do rei. Torre, Bispo, Cavalo estavam animados para o início. Naquele mundo as partidas eram intermináveis e sempre que um dos reis tombava iniciavam-se novas partidas. Ao comando das rainhas as demais peças seguiam no duro combate contra o adversário. Porém chegou um tempo em que aqueles considerados sem importância puseram-se a pensar e essa atitude ameaçou o reinado das brancas. Por certo todo o exímio jogador sabe que os peões são as menores peças do tabuleiro, representam a infantaria de um reinado e vão a frente, seguidos pelas peças de maior valor. O sonho de um Peão era alcançar o outro lado do tabuleiro, desbravar todo o campo de batalha e chegar às casas outrora ocupadas pelos magistrados inimigos, podendo assim se tornar um guerreiro lendário no seu próprio reino, quem sabe até mesmo, uma nova rainha. Nada honroso era para um soldado, chegar ao apogeu de sua carreira e trocar de sexo. Mas sabia ele das vantagens que haveriam possuindo os poderes da primeira dama. Raramente achava-se um, que desejasse tornar-se uma torre ou ministro da igreja. Mas essa história não é sobre a sexualidade dos peões, nem tão pouco dos desejos ocultos no coração de cada um daqueles 8 soldados. Essa história narra o descaso da rainha pelos nobres combatentes que iam a frente da batalha sacrificando suas vidas a fim de manter seu reino glorioso. Não havia nenhum mérito em ser peão, ele sabia que na primeira e melhor oportunidade seria sacrificado com a finalidade de eliminar uma peça de grande valor adversária. Às vezes, por um erro de calculo, via-se peão contra peão numa luta sangrenta onde restavam poucos pra contar a história e o jogo seguia fervoroso somente com aqueles que eram os detentores da glória. Mal sabia rainha que dentro de cada um daqueles pequenos bonequinhos de madeira, batia um coração que deseja ser valorizado, e os dias passaram-se até que eles decidiram fazer o jogo virar. — Como pode ser isso? — Questionou o senhor Bispo da esquerda. — Eles acham que são gente! — Exclamou a Torre da direita enquanto as demais peças permaneciam em silêncio, aguardando a Rainha Branca tomar alguma atitude. [68]