Revista LiteraLivre 19ª edição | Page 48

LiteraLivre Vl. 4 - nº 19 – Jan./Fev. de 2020 Chegamos na Linha Amarela. Estamos convivendo há mais de 10 minutos, tempo suficiente para qualquer carioca se sentir íntimo e começar a investigar minha vida pregressa: — Mas o patrão – detesto ser chamado de patrão - trabalha com o quê? — Sou engenheiro... Nem deu pra completar. O tratamento mudou completamente. — Então o patrão é doutor!!! Ainda tentei explicar que não era doutor, mas um mero bacharel. Nem a titulação de mestre alcancei, quem dirá a de doutor! — Mas você não trabalha, não é? – me olhando com expectativa. — Como assim? – respondi entre surpreso e confuso – Sim, eu trabalho como engenheiro... — Nãããão – esclareceu o taxista com um sorrisinho cúmplice no rosto – eu digo trabalhar, trabalhar mesmo, a valer. Botar a mão na massa. Suar a camisa. Você só manda, não é? — Não. Na verdade faço tudo, desde montar as ferramentas até limpar elas depois. Aquilo foi uma decepção total para o taxista. Balançava a cabeça negativamente. — Isso não está certo, não. Eu achava que o engenheiro só mandava nos técnicos. Eu conheço engenheiros que só mandam. Nunca vi um que trabalhasse de verdade... Isso é mais normal do que deveria. Desgraçadamente, normal entre nós, brasileiros, porque para os gringos é perfeitamente natural que um engenheiro rale como qualquer outro trabalhador. Tento desmistificar o mal entendido. — Muito pelo contrário. Trabalho pesado, me sujo de lama, de graxa... [45]