Revista LiteraLivre 18ª edição | Page 66

LiteraLivre Vl. 3 - nº 18 – Nov./Dez. de 2019 que então iria descer para a rua e checar o que estava acontecer. Aliás, era essa sua função. Ele abre a porta de supetão. No corredor escuro e destruído do andar, uma avantesma adiantou-se a fugir do facho de luz enquanto o vigia já aflito processava a visão fugaz, tentando vencer o terror. Sem muito o que raciocinar, corre para as escadarias que levavam até a rua, por onde o vulto havia também se projetado. A rua escura, agora, parece coberta de uma emanação avermelhada, que dançava como a luz de uma chama. Mas o ar estava frio e espesso, tanto que a respiração entrecortada do vigia assustado evolava de sua boca na forma de vapores brancos. O vigia tenta se recompor antes de correr para a rua principal, de onde a luz surgia e o único lugar para onde a sombra fugitiva poderia seguir. Na rua, deparou-se com um horizonte próximo em um ardor de chamas, com um brilho místico e aterrador, como em um pesadelo ou delírio. A poucos metros dele, uma figura esquálida, uma forma negra e vagamente humana, ainda mais escura com o lumiar das chamas em seu contorno, estava parada a sua frente. Novamente a vontade de gritar surge na garganta do vigia, quando a figura começa a se virar para ele, revelando seu demoníaco semblante ao mesmo tempo em que crescia em tamanho, assim como as chamas do horizonte, se tornavam maiores e mais vigorosas a medida que engolia os prédios e as ruas. Então, o grito não dado por ninguém foi ouvido. Apenas, ao findar a terrível hora, o clique do relógio retoma sua contagem, decidido. [63]