LiteraLivre Vl. 3 - nº 18 – Nov./Dez. de 2019
havia aguentado aquela solidão e escuridão por tempo demais, até enlouquecer.
Com ele não seria tão diferente assim.
De qualquer forma, um medo se instalou nele e o ambiente, antes sereno, tomou
ares funestos e vestes pesadas. Ele fecha a porta do quarto, senta-se a frente
dos monitores e aguardaria ali pelo próximo empregado, enquanto via a falta de
movimento da rua e ouvia apenas o tique-taque do relógio despertador a contar
o tempo, resoluto.
Quinze para a meia-noite. Nada. Apenas a pressão no peito e um certo
desconforto que não experimentou antes. Como se algo houvesse mudado
repentinamente. Não lhe agradava a ideia de permanecer ali até depois do
expediente, no entanto também lhe incomodou o fato de que teria que fazer o
longo trajeto até as cercanias da cidade. Sua perna começou a se mexer com
certo nervosismo que lhe era novidade.
Cinco para a meia-noite. O ponteiro do relógio, de repente, pareceu-lhe lutando
contra alguma força invisível, e cada segundo era vencido com um esforço extra,
tornando os segundos mais lentos e distendidos.
Meia noite. A campainha do relógio toca um único timbre e o ponteiro, então,
finalmente se rende. O relógio para. O vigia tenta bater nele, retirar as pilhas e
recolocá-las, mas nada surtia efeito. Havia parado completamente, como se
tivesse desistido. Uma coincidência nem um pouco alentadora.
O vigia então se vira para os monitores. Aguardaria ali até amanhecer, se
necessário.
O vagar lento do tempo, já sentido antes, agora tornava-se ainda mais
insuportável. Algo iria acontecer no meio do silêncio, no meio da penumbra, no
meio do abismo daqueles momentos. Como um grito preso na garganta, o vigia
aguardava temeroso o tempo dilatado e agora sem medida.
Então, uma sombra escorre por um dos monitores. Algo se espalhava pela
imagem na tela como piche. Do grito na garganta, o vigia, assombrado, solta
apenas um soluço, enquanto a sombra se estendia para os outros monitores e
em poucos e aterrorizantes segundos cobria a sua visão do exterior.
Alarmado, o vigia tenta organizar seus pensamentos, tentando conceber o que
deveria fazer. Corre para a janela, de onde poderia avistar algo. Nada. Com a
lanterna que sempre carregava tenta a câmera mais próxima para averiguar o
que a havia coberto. Não consegue avistar a câmera da posição da janela. No
entanto, contornando a esquina, um tênue brilho avermelhado irradiava, como se
uma fogueira tivesse sido acesa, ou mesmo o alvorecer começasse a despontar.
Atônito, o vigia tenta novamente colocar seus pensamentos em lugar, e decide
[62]