Revista LiteraLivre 15ª edição | Page 182

LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019 O senhor Alec demonstrou-se claramente aborrecido, mas afinal era uma cidade fictícia, Eddie precisava saber exatamente o que colocar. - S-O-N-D-A-L-E - Disse o senhor friamente. Eddie terminou de digitar e fez um gesto para que ele continuasse, lembrando em seguida de sua deficiência e então expressando o pedido verbalmente. - Para a jovem e nada condizente com sua realidade Silvia Brokst, foi definitivamente o ano mais importante de sua vida... - Espere, temos o mesmo problema de antes... Quando for falar nomes de pessoas ou lugares soletre pra que seja perfeito, ok? - Seus irmãos e seus pais já não lhe davam atenção, era dedicada às pesquisas e isso bastava para criar a ilusão de que era feliz - Prosseguiu o senhor Alec sem dar muita importância ao último comentário. E assim se seguiu, naquela tarde tortuosa, o discurso de incontáveis palavras e sentenças, descrevendo cada vez mais a jovem Silvia e seus sentimentos, sua vida da qual ninguém mudaria uma ponta mas na qual ela própria não se sentia segura. Eddie tentava ao máximo não interromper o senhor Alec durante suas sentenças, mas aquilo não era igual ao que estava habituado nas reuniões do escritório em que trabalhava. Era preciso se adequar aquele novo trabalho, cooperar com o velho já abatido e tentar facilitar ao máximo as coisas. Estava trabalhando sua paciência mais do que nunca. O senhor Alec se sentia plenamente disposto, afinal não contava uma estória havia muito tempo. Lembra-se dos dias que passava de frente para o computador finalizando uma trama, ou começando outras... Sentia falta disso, e agora não era mais do mesmo modo. Ainda assim poder fazer isso era gratificante, se pelo menos Eddie não fosse tão jovial e apressado, pensava ele... Ao final da tarde, lá pelas seis, o sol já se despedia da cidade e cobria o cômodo sem luz artificial da sala de um alaranjado aconchegante. - E é isso por hoje, certo? - Perguntou Eddie estalando os dedos e torcendo para que o senhor Alec não pedisse que ficasse mais um pouco. - Sim, já pode ir, garoto - Disse ele se levantando duramente da poltrona. - Pelo menos temos o começo. Eddie sorriu e salvou o arquivo no computador. - Sabe... - Disse pegando sua pasta e as demais coisas que trouxe. - Não foi tão ruim, conseguimos duas páginas. Pra um primeiro dia deve ser ótimo. O senhor Alec nada disse. Resmungou um pouco e pegou sua bengala, depois vasculhou a mesinha de apoio ao lado da poltrona à procura da xícara vazia de café. - Volte amanhã - Foi só o que disse. 179