LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019
O Despertar
Jeracina Gonçalves
Barcelos, Braga, Portugal
A árvore abriu os olhos de mansinho. Estremunhada, espreguiçou-se, bocejou
e olhou em seu redor: o Sol brilha radioso no céu azul salpicado aqui e além de
pequenos farrapos de nuvens brancas, a luz aumentou na intensidade e no
tempo e o ar, doce e tépido, perdeu a aridez agressiva dos dias passados, dos
minúsculos e tristes dias de Inverno; no chão, a seus pés, chilreiam passarinhos
e catam os bichinhos da terra, e uma brisa suave e gostosa afaga-lhe o corpo
dormente do longo sono de Inverno.
A árvore Estremece. Sente que a seiva começa a circular-lhe nos vasos com
mais força, e transmite-lhe uma vontade indomável, persistente, de viver, de se
enfeitar, de cobrir-se com o seu belo manto verdejante, para poder participar
com as outras árvores suas irmãs e com todos os seres vivos da Terra, na
maravilhosa festa do renovar da Natureza. Quer pôr-se bonita. Vigorosa. Forte.
Pequenas erupções vão surgindo, aqui e além, nos seus ramos adormecidos
durante os escuros e tristes dias de Inverno, e assusta-se. Sente um prurido que
a incomoda e a pele começa a encher-se-lhe de pequenas borbulhas...
"Que está a acontecer-me? Que prurido é este que me acossa e aborrece? E
logo agora, que me sentia mais forte e com vontade de viver e ser feliz..." –
murmura baixinho, preocupada com os sintomas que perpassam pelo seu corpo
ainda mal acordado do longo sono de Inverno.
Porém, pouco depois, as pequenas borbulhas dão lugar a folhinhas tenras e
verdes ou a coloridas e perfumadas flores. E a árvore cobre-se com um lindo
manto colorido e perfumado, que a enche de orgulhosa vaidade, e fascina
quantos dela se aproximam.
A árvore está feliz. Quer viver. Amar e ser amada. Reproduzir-se.
E, cheia de força e de uma encantadora vitalidade, dança um sensual e
romântico bailado ao ritmo da brisa que a abraça, e mostra-se, com orgulho,
sedutora, enamorada e feliz, a quem queira admirá-la. E toda a natureza a
aprecia. Toda a natureza se deixa arrebatar pelo seu encanto e se apressa a
usufruir da sua natural generosidade: as abelhinhas correm para ela e beijam
com paixão os estames das suas flores; os passarinhos brincam às escondidas
entre os seus ramos verdes e tenros e procuram abrigo dos seus braços, para
neles construírem as suas casinhas e constituírem família e, aí, protegidos pelo
acolhedor e verdejante manto amigo, criarão os seus filhinhos com dedicação,
atarefados em dar-lhes calor e alimento.
Todos os bichinhos procuram o calor do seu seio. E ela, amiga, como mãe
carinhosa e protetora, a todos acolhe, a todos protege, a todos sacia.
A árvore despertou do seu longo sono e recomeça um novo ciclo em sua vida.
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