LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019
No Caminho da Serpente
Micheli Biek
Vera Cruz/RS
Era um dia de sol escaldante do mês de dezembro, daqueles dias em que o calor imprime
sua vibração sobre a paisagem, transfigurando a visão. A família de agricultores preparava-
se para iniciar mais um dia na colheita do tabaco. O pai amarrava a junta de bois sob uma
esparsa sombra oriunda de uma árvore semimorta. A mãe ajudava os filhos a descerem da
carroça. O diarista, que auxiliava a família vez ou outra, já estava colhendo as primeiras
braçadas de tabaco, deixando apenas os talos nus.
As duas crianças foram deixadas sob a sombra da carroça, que se projetava numa das
laterais, alcançando a estrada de chão batido. A estrada estava coberta com uma grossa
camada de pó, sobre o qual ambos brincavam desenhando figuras. Era a única diversão de
que dispunham, já que não podiam brincar no meio da lavoura, pois o calor escaldante e o
inço que forrava o chão poderiam esconder cobras e outros animais peçonhentos.
Essa ameaça era mais que suficiente para a menina permanecer alegremente na beira da
estrada, longe do mato. Cobras a assombravam. Desde o dia em que vira sua tia correndo
de casa com o bebê no colo, fugindo de uma serpente que encontrara no quarto da criança,
seu medo tornou-se pavor. A imagem fantasiosa que criara da serpente engolindo o
bebezinho não saía de sua mente, por isso evitava a todo custo encontros com as tais feras
rastejantes.
Á meia-tarde a mãe retornou da lavoura e entregou-lhe a chave da casa para que fosse
buscar água. O garrafão que tinham trazido acabara e havia outro em casa, na geladeira. A
menina sentiu seu coração disparar. Perguntou se o irmão poderia realizar a tarefa. Não
podia. Ela era a mais velha e, além disso, ele não conseguiria carregar o garrafão. Pediu
então que ele ao menos a acompanhasse, mas o menino negou-se.
Aterrorizada pediu encarecidamente que a mãe fosse junto “só até ali”. Mas a mulher
também se negou. A menina, então, suplicou com lágrimas nos olhos. A mãe, já sem
paciência, precisando retornar à lavoura, sentenciou “ou busca a água ou apanha”. O pavor
começava a dominar o coração daquela miúda, que se via deixada á própria sorte.
O que tanto a atemorizava era um pequeno trecho de cerca de quinhentos metros de
estrada de chão cercado de água pelos dois lados. De um dos lados havia o pequeno açude
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