Revista LiteraLivre 15ª edição | Page 100

LiteraLivre Vl. 3 - nº 15 – Mai./Jun. de 2019 plantas, todos os aposentos dispunham de pequenas caixas de som fixadas ao teto e tocavam músicas clássicas em volume baixo. Três meses se passaram. Edneia encontrou um envelope pardo na estante da sala. Dentro, havia alguns documentos: um atestado de óbito de mais de 40 anos e uma carta, ambos da falecida esposa de Virgílio. Na carta, a esposa informava que gostaria de ser cremada e suas cinzas depositadas dentro de um vaso com bonsai. Edneia soube, pelo médico de Virgílio, que o pobre homem era viúvo há algumas décadas e que sua esposa tinha verdadeira adoração por plantas. Ela guardou o envelope exatamente como estava e saiu para fazer compras. Ao retornar, encontrou a porta dos fundos aberta pela primeira vez. Havia música em volume mais alto vindo daquela abertura. E, ao entrar, teve um sobressalto. Era uma passagem secreta. Uma grande estufa de plantas feita de vidro em todo o seu redor, ligada à casa, continha gardênias, girassóis, jacintos, violetas, margaridas, rosas vermelhas e amarelas, cravos, orquídeas, jasmins, hortênsias, copos de leite, amores perfeitos, bocas de leão, calêndulas, cravinas, gerânios, dálias, miosótis, prímulas e outras que ela não conseguiu identificar. Os vários perfumes entravam deliciosamente em suas narinas. Algumas flores eram cultivadas nos canteiros e outras em pequenos vasos iguais aos que estavam no interior da casa. Ela andou com passinhos arrastados, boquiaberta, quase não acreditando no que via. Virgílio estava sentado em um mochinho em frente ao bonsai de bordo cultivado num vaso enorme. Era uma pequeníssima árvore oriental de lindas folhas outonais, em tons avermelhados. A música que ele ouvia era Adagio, de Albinoni. O som do violino parecia verter lágrimas. Virgílio percebeu a presença intrusa de Edneia somente no instante em que ela se aproximou. O segredo estava revelado. De súbito apanhou sua bengala e atingiu Edneia com vários golpes na cabeça, até sangrar. A pobre mulher correu, chorando, deixando cair os ovos das 97