LiteraLivre Vl. 3 - nº 13 – Jan/Fev. de 2019
Em Nome da Ciência
Fernanda Caleffi Barbetta
São Bernardo do Campo/SP
Eu sempre fui a favor dos experimentos práticos. E foi graças a esse meu quê de
cientista que eu resolvi testar nosso amor cientificamente.
Fiz do lavabo um laboratório. Uma espécie de "lavaboratório". Ela me olhou
desconfiada, fez algumas perguntas e me seguiu durante os primeiros cinco
minutos, certamente com receio de que eu quebrasse alguma coisa. Eu disse
apenas que estava fazendo um experimento e que arrumaria tudo quando
terminasse. Ela aceitou, ainda desconfiada.
Fui até a cozinha, peguei uma peneira, daquelas de lavar arroz, coloquei luvas de
borracha, avental branco até o joelho, fechei a porta do lavabo e desliguei o
celular para que nada me atrapalhasse. Então, peguei nosso amor com todo o
cuidado e o coloquei na peneira. Eu precisava saber o que de sólido havia
naquela relação.
Imediatamente, um líquido espesso começou a escoar, passando livremente
pelos orifícios do utensílio de plástico. E escoou por dez dias. Dez intermináveis
dias. Interditei o lavabo e fiquei observando..
Não demorou muito para que ela suspeitasse de que algo havia dado errado. Eu
também não tinha imaginado que demoraria tanto. Quase interferi nos resultados
finais ao cogitar vasculhar a peneira ou dar algumas batidinhas repetidas na pia
para tentar acelerar o escoamento. Mas meu lado cientista me impediu.Eu
precisava ter paciência para saber se nosso amor tinha algo de consistente.
No terceiro dia ela exigiu seu lavabo de volta, embora o usássemos com uma
frequência quase anual. Com jeitinho, pedi que confiasse no meu experimento e
disse que deixaria a porta entreaberta para que ela pudesse espiar. Mas mantive
os detalhes sobre o experimento em sigilo.
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