LiteraLivre Vl. 3 - nº 13 – Jan/Fev. de 2019
como em nenhum outro mundo. Que significava aquilo? Era da terra que subiam
as correntes de luz.
Distante, na terminação das dunas e começo de uma baixa banhada por
uma lagoa, os sons que ouvi anteriormente elevavam-se. Já estive naquele lugar
e conheço o caminho para lá. O caminho era por entre as dunas. De um lado e de
outro, a areia branquinha se amontoava. Por causa da altura daqueles morros,
nada se via além de sua alvura. Me perdi do índio. Ele trouxera flores para
iluminar minha direção. Era esse seu propósito, então eu seguia, gravando suas
flores em meu coração.
Me afundei nas areias. Olhei para trás por um breve momento,
reconhecendo o lugar onde me encontrava. Estava em cima dos morros que
terminam em Magia, bem no terreiro dos Encantados. Era assim o local: entre o
Rio, o Mar, a Lagoa, a Baixa e os Morros foi construída a casa na qual todos os
Cavaleiros se ajuntavam para Curar. Aquela casa bebias das origens do Mar, dos
segredos dos Astros, das forças do Rio, da natureza das Matas, dos caminhos nas
areias dos Morros. Uma casa realmente especial, onde o Antigamente tinha
escolhido desaguar.
Fui em sua direção. Também nela me desaguaria. Deixava atrás de mim
uma pequena floresta de arbustos, que poderia ser melhor vista do firmamento
pelas estrelas. Somente as estrelas me faziam companhia neste horário
profundo. Quanto mais me aproximava da baixa, mas eu podia sentir o que
estava se passando. A casa que havia ali estava cheia de gente que não existe e
eles cantavam uma melodia, que ao subir pelas frestas do telhado enveredavam-
se em correntes de luz que subiam aos céus. Eram aquelas correntes que
iluminavam a lua.
Aquela visão era como nenhuma outra, por isso é tão difícil explicá-la.
Essas coisas só podem acontecer quando não se espera. O tambor soando baixo
para acompanhar misticamente a maravilha. Desde o início deste acontecimento
as palavras assumiram outras formas que não aquelas conhecidas por nossa
linguagem. Elas insistiam em se transformar em outras coisas. Cada palavra
daquela gente se transformava numa faísca luminosa que ao se juntar umas com
as outras subiam em labaredas na direção do céu. Correntes de luz se
enroscavam, acendiam o firmamento e cortavam as nuvens. Indo se ajuntar na
lua, clareando-a, como somente o sol ousa fazer.
O fumo das orações acendia a lua no alto céu.
Do alto da duna contemplava silencioso aquele fenômeno. Não pude
descer mais, meus pés estacionaram dentro da areia, como que impedidos de
prosseguir. O vento me empurrava em direção contrária. Por causa dele entendi
que não poderia continuar. Aquele lugar não poderia ser tocado por meus pés. Eu
só poderia vê-lo à distância. Sei que aquela gente que reza não é como eu. É
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