Revista LiteraLivre 12ª edição | Page 183

LiteraLivre Vl. 2 - nº 12 – Nov./Dez. de 2018 Zé da Luz e Deus na Terra do Sol Eduardo Lima Três Marias/MG História de fome não é história que se conte; Principalmente quando nos persegue tão longe; É só tristeza e vergonha estampada na fronte. Hoje conto a sofrida saga de um pobre cidadão; Que saiu despedaçado daquele estorricado pedaço de chão; Caminho da maioria que sangra todo dia por migalhas de pão; Nas afiadas garras da mais protegida moderna escravidão. Até então ele vivia feliz e satisfeito naquele sertão; É verdade que era o solo mais seco daquela região; De vez em quando ele praguejava aquela sequidão; Mas logo a esperança voltava e ele achava a solução. Do gado ele cuidava e plantava um pequeno roçado; Dois terços do trabalho ele entregava ao dono do gado; No final das tardes vermelhas, cansado, ele voltava do trabalho; E a mulher na porta ele encontrava feliz com menino no braço. Mas daquele ano em diante a seca foi feroz; Abocanhou todo pingo d’água da nascente até a foz; Ele achou que o fim tava bem próximo pra todos nós; Mas era só o princípio do fim desta saga atroz. Secara tudo que a vista alcança da vereda até a serra; Foi aí que ele perdeu a esperança em seu povo e sua terra; Em todo canto ele procurava água cavando até a pedra; Mas nenhuma miserável gota brotava em sua gleba. Desanimado ele sentou na pedra beira riacho seco e viu; Todo aquele cenário de horror que o homem construiu; Línguas de fogo suspensas ligando a terra ao céu anil; E todo aquele cerrado imenso transformado em carvão e lucro vil. Bateu nele uma depressão diante do espetáculo de horror; Que sentiu, dentro do peito, seu coração endurecendo de dor; Veio uma vontade danada de acabar com aquele filme de terror; 177