Revista LiteraLivre 11ª Edição | Page 83

LiteraLivre Vl. 2 - nº 11 – Set/Out. de 2018 — Escutando? — Meu pai está me chamando. Está cada vez mais forte. Acho que ele precisa de mim. Meu Deus, ela está louca. O silêncio é tão grande que é possível ouvir a mosca bebendo meu café. — Não escuto nada, minha senhora. Eu sei o quanto está preocupada com ele, mas confie nos médicos. Qual o nome do seu pai? Vejamos... A ficha do seu pai diz que ele só está em uma simples cirurgia de redução de estômago. Logo vai poder conversar com ele. A mulher me olha desconfiada, mas volta a sentar. Após cinco minutos, a mulher levanta aflita. — Não posso mais esperar. Meu pai está gritando. Preciso entrar. Tudo bem, provavelmente é pegadinha. Procuro as câmeras escondidas na sala de recepção, mas nada fora do esperado. Encaro os olhos aflitos da mulher, que aparenta segurar uma bomba em seu peito. Algo nela me preocupa. — Minha senhora, por gentileza, espere mais um pouco - tento mais uma vez. Quem sabe ela entenda agora. - O hospital garante que seu pai está bem. Não entende. Apoiando-se no balcão, explode: — Você não pode fazer isso comigo! Meu pai precisa de mim! Agora! Vou entrar e você não pode fazer nada contra isso! Nada! Agindo por impulso, pego o telefone. Chamar a segurança é o melhor para este caso. A mulher não espera minha reação e, abrindo a porta ao lado da recepção, corre hospital adentro. Desisto do telefone e corro atrás dela. De alguma forma, ela corre na direção certa. Passa direto pelos corredores errados e vai à ala de recuperação. Já esteve neste hospital muitas vezes, penso. Mas, em tempos periódicos, ela para e parece escutar por um breve momento, apressando sua corrida ainda mais, me impedindo de alcançá-la. Era difícil chegar perto dela. Eu deveria ter investido mais na academia e menos em brigadeiro. 77