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Vidas Raras Revista ideaas | DOIS | UM JOGO DE FAZ DE CONTA QUE NÃO AJUDA NINGUÉM É Regina Próspero Vice-Presidente do Instituto Vidas Raras sempre difícil falar de algo desagradável. E imaginar que uma doença rara pode acome- ter alguém próximo é impensável, certo? Por isso mesmo, em geral, as pessoas vivem um processo de negação: “como não tenho ninguém na família com esse problema, finjo que ele não existe. E que nunca vai fazer parte da minha vida”. Mas isso é tapar o sol com a peneira. As doenças raras são uma realidade e podem atingir qualquer um de nós – 8% da população mundial pode ter uma e muitas dessas pessoas nem sabem que carregam o gene. Justamente por causa desse jogo de fingir que as doen- ças raras não existem é que o Brasil – isso vale para cada um de nós – não sabe e não está preparado para cuidar dos pacientes. A sociedade costuma ser egoísta. Como acredita que não vai acontecer com ela, não dá atenção ao assunto e só vai se mexer quando um familiar precisar de tratamento. Para saber mais: Com os médicos, também não é diferente. A maior institutovidasraras.com.br parte acredita que nunca terá um caso no consultório. Engano: com certeza ele já se deparou com vários e nem percebeu. Em relação aos gestores de instituições de saúde, ocor- re o mesmo – o que costumamos encontrar são pes- soas que não têm a menor ideia do que é uma doença rara e da urgência de se resolver pontualmente alguns problemas burocráticos, como a liberação de um me- dicamento ou de um tratamento, por exemplo. Mui- tas vezes é o caso de escolher entre a vida e a morte. E esses profissionais não percebem que o destino de um paciente depende de um processo administrativo. Por essas e outras, nosso trabalho no Instituto Vidas Raras continua sendo uma incansável luta para sensi- bilizar todas essas pontas, além de conectar pacientes a profissionais de saúde especializados no tratamento de determinadas enfermidades. Mais: nos dedicamos, ainda, a convencer os gestores a facilitar o acesso a exames, medicamentos e tratamentos multidiscipli- nares. É um trabalho de formiguinha que nos traz muitas vitórias. Mas precisamos de mais. Precisamos que todos se conscientizem de que uma doença rara pode fazer parte do nosso dia a dia a qualquer tempo. E que temos de criar condições para garantir cuidados e qualidade de vida para os nossos pacientes. Doença rara em destaque Amiloidose Hereditária O que é: trata-se de uma doença causada por mutações no gene da proteína transtirretina. É caracterizada pelo depósito dessa proteína insolúvel nos tecidos, o que impacta a estrutura e a função deles. Já foram identificadas mais de 120 mutações nesse gene. Quem pode ter: em geral, atinge, igualmente, homens e mulheres adultos. Pode ocorrer o início precoce (de 25 a 35 anos) ou tardio (após os 50 anos). No Brasil, tem prevalência entre os descendentes de portugueses e africanos. Sintomas: podem incluir neuropatia periférica (que afeta nervos sensitivos e motores) e autonômica (que atinge o sistema nervoso, responsável por regular o funcionamento dos órgãos e sistemas do corpo). Diante disso, podem ocorrer disfunção gastrointestinal, manifestações oculares, cardiopatia, comprometimento da função renal ou síndrome do túnel do carpo. A doença é fisicamente debilitante, afeta múltiplos órgãos e sistemas e interfere significativamente na qualidade de vida. É fatal se não for tratada. Para ficar atento: algo que não é muito valorizado é o histórico familiar. Se já houve casos próximos, é preciso observar com atenção sinais como perda de peso, diarreia, vômitos, dores e/ ou falta de sensibilidade nos pés e nas pernas. Os sintomas se confundem com os de diversas doenças, mas, aliados à informação ou suspeita de que houve casos de TTR na família, é importante investigar melhor. Cenário atual: cerca de 50 mil casos no mundo e por volta de 5 mil no Brasil. Fonte: Fábio Almeida, presidente da Associação Brasileira de Paramiloidose (ABPAR) 28