Revista de Medicina Desportiva Janeiro 2021 | Page 34

Rev . Medicina Desportiva informa , 2021 ; 12 ( 1 ): 32-35 . https :// doi . org / 10.23911 / SPMD _ 2021 _ jan Dr . João Paulo Delgado 1 , Dr . José Pedro Marques 2
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Interno de Medicina Desportiva , Centro de Medicina Desportiva de Lisboa ; SPMD ; 2 Médico especialista em Medicina Desportiva ; Unidade de Saúde e Performance da FPF ; Hospital da Luz – Torres de Lisboa e Aveiro ; SPMD . Lisboa
No passado dia 20 de outubro de 2020 , entre as 21:00 e as 22:30 horas , o Grupo de Estudos de Decisão Médico-Desportiva e Clínica Médica da SPMD promoveu um webinar subordinado ao tema Exame Médico- -Desportivo : Tempo de Mudar ?
A sessão contou com a moderação do Dr . José Pedro Marques , especialista em Medicina Desportiva ( MD ), e do Dr . Paulo Beckert , especialista em Medicina Física e de Reabilitação ( MFR ) e MD . O painel foi completado pelo Prof . Dr . Hélder Dores , cardiologista , pelo Dr . Diogo Dias , especialista em MD , e pelo Dr . João Tavares , pediatra .
Assistiram à sessão mais de 140 médicos com interesse e experiência na temática da avaliação pré-participação desportiva . Foi discutido o modelo atual do Exame Médico-Desportivo ( EMD ), partindo dos resultados de um inquérito desenvolvido pelo Grupo de Estudos e distribuído previamente aos associados da SPMD .
Este inquérito contou com um total de 87 respondentes , a maioria dos quais de MD , Medicina Geral e Familiar e MFR . Foi solicitada a opinião dos inquiridos sobre um conjunto de elementos importantes para a implementação do EMD , entre os quais :
• Momento de realização do primeiro EMD ( 69 % responderam que deveria ser realizado aquando da inscrição num clube ou federação );
• Periodicidade do EMD ( 66 % responderam que o EMD deveria ser realizado anualmente );
• Objetivos do EMD : para além do rastreio de patologia cardiovascular e musculosquelética , salientou-se durante a discussão a importância do EMD enquanto oportunidade de educação para a saúde do atleta , sendo dado como exemplo as questões específicas relacionadas com a dopagem ;
• Existência de modalidades de “ baixo risco ” ( ex . xadrez ), nas quais se pudesse justificar a dispensa do EMD : 71 % dos inquiridos responderam que o EMD também deve ser mantido nestas modalidades , o que vai de encontro à perceção dos objetivos do EMD , referidos acima ;
• Existência de modalidades de “ alto risco ” ( ex . desportos de combate ), nas quais se pudesse justificar um aumento na periodicidade do EMD . Nesta questão houve maior divergência entre os inquiridos , com 47 % a considerarem justificável o aumento da regularidade do EMD em algumas modalidades . Na discussão reforçou-se a importância da experiência e senso clínico do médico que avalia o atleta , devendo este decidir a necessidade de avaliações subsequentes em função da informação obtida e da melhor evidência disponível ;
• Exames complementares de diagnóstico a associar ao EMD . Para além do eletrocardiograma ( ECG ) anual , exame que reúne um consenso alargado na prática clínica atual , foi debatida a possibilidade de se efetuarem outros exames de rastreio em situações específicas , como o ECG de esforço em atletas com mais de 35 anos de idade . Salientou-se o desafio de conciliar a evidência atual e emergente com a experiência clínica , tendo também em consideração os recursos disponíveis no momento e a variabilidade na relação custo-benefício para cada atleta .
Durante a discussão , além dos aspetos práticos associados à realização do EMD , abordou-se o problema da desvalorização do mesmo entre atletas e dirigentes de clubes . Esta foi atribuída ao facto de o EMD se tratar de um ato médico obrigatório dirigido a uma população maioritariamente saudável , o que pode levar a que seja encarado como uma formalidade de caráter administrativo . Por outro lado , a escassez de profissionais com diferenciação para realizar EMD anualmente a cerca de 600.000 desportistas federados e o reduzido valor habitualmente cobrado por estas avaliações , contribuem para que a qualidade com que este ato médico é realizado fique , frequentemente , aquém do desejável . Tais factos contribuem , inevitavelmente , para a desvalorização do EMD junto dos diferentes agentes desportivos , gerando um círculo vicioso .
No debate sobre possíveis soluções para este problema foi reforçada a necessidade de promover a formação de mais médicos nas competências específicas para a realização do EMD , bem como a importância de uma comunicação mais clara junto dos atletas e demais agentes desportivos relativamente ao propósito do EMD . Para assegurar a qualidade deste ato médico considerou-se fundamental o desenvolvimento de um registo eletrónico , de modo a facilitar a recolha e partilha de informação entre os profissionais qualificados e possibilitar a realização de procedimentos de auditoria clínica . Independentemente destas eventuais mudanças , a valorização do EMD deve começar pelos próprios médicos que o efetuam . Qualquer médico que pretenda realizar EMD deverá reconhecer as responsabilidades inerentes a este ato , procurar adquirir as competências necessárias e exigir junto das entidades que o solicitam as condições mínimas necessárias para a sua execução .
32 janeiro 2021 www . revdesportiva . pt