Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2016 | Page 15

Os doentes foram propostos para tratamento conservador e submetidos ao mesmo protocolo com terapêutica sintomática , crioterapia em fase aguda e marcha com apoio externo durante os primeiros 7-10 dias . Após este período iniciaram marcha progressiva com apoio externo durante 4-6 semanas e programa de reabilitação funcional focado no fortalecimento muscular progressivo do membro inferior direito . Foram reavaliados em Consulta de Ortopedia às oito semanas e constatada boa evolução clínica com força muscular simétrica dos membros inferiores e consolidação óssea da fratura com alongamento do pequeno trocânter ( Figura 2 ). Ambos os doentes retomaram o nível prévio de atividade desportiva aos dois meses após a lesão , com mobilidades simétricas indolores e sem sequelas pós-traumáticas .
Após 22 meses de seguimento do caso 1 e 4 meses do caso 2 , observou-se um excelente resultado clínico e funcional após tratamento , com um Hip Outcome Score ( HOS ) de 100 % ( 68 pontos ) em ambos os casos para a subescala das atividades de vida diária e de 100 % ( 36 pontos ) no caso 1 e 92,7 % ( 35 pontos ) no caso 2 para a subescala de atividade desportiva .
Discussão
A fratura isolada do pequeno trocânter é uma lesão rara que ocorre maioritariamente em contexto desportivo . Esta avulsão apofisária , frequentemente associada ao movimento de remate no futebol , explica-se devido a um mecanismo de exposição local repetitiva ( overuse ) de forças de tensão na inserção distal do músculo psoas-ilíaco , que podem condicionar fragilidade
Figura 2 – Rx da bacia ( AP ) às 8 semanas – Fratura com consolidação e alongamento do pequeno trocânter ( Caso 1 – esquerda ; Caso 2 – direita ) anatómica da placa epifisária do pequeno trocânter e que quando associada a contracção muscular excêntrica violenta e súbita podem levar ao seu arrancamento 2 , 3 , 5 , 7 , 8 . Assim , a fratura avulsão surge devido a um desequilíbrio entre a força muscular do psoas-ilíaco e a resistência da placa osteocondral na sua inserção tendinosa 3 . Esta condição , que afecta essencialmente atletas do género masculino entre os 13 e os 19 anos 3 , 4 , não é expectável que ocorra em adultos dado o encerramento da placa de crescimento já se ter verificado , associando-se frequentemente nestes casos a estiramentos musculares 3 . Quando na presença de fratura avulsão isolada do pequeno trocânter após a maturidade esquelética , a suspeição diagnóstica deve ser direccionada para a possibilidade de fratura patológica 8 , 9 .
O tratamento da fratura avulsão isolada do pequeno trocânter , embora controverso , é habitualmente conservador , reservando-se a cirurgia para os casos em que o desvio é superior a 2-3cm ( por potencial conflito isquiofemoral ) e nos casos de pseudartrose ou exostose dolorosas ( Tipo IV da Classificação de Martin e Pipkin modificada ) ( Tabela 1 ) 10 .
Tal como nos casos descritos , o tratamento conservador deve compreender um período inicial de controlo sintomático da fase hiperálgica , marcha em descarga com canadianas mediante tolerância à dor ( 7-10 dias ), e carga parcial progressiva durante 3-6 semanas com programa de reabilitação funcional para reforço muscular do membro . Quando considerado o tratamento cirúrgico , este preconiza a excisão de pequenos fragmentos dolorosos ou tentativa de cruentação e osteossíntese no caso de pseudartrose dolorosa com fragmentos de maiores dimensões 10 . O retorno desportivo , embora não consensual , habitualmente ocorre entre as 6 e as 12 semanas , sendo previsível a obtenção de um nível competitivo semelhante ao verificado previamente à lesão 10 .
Classificação das fraturas avulsão apofisárias
Tipo I Tipo II Tipo III Tipo IV
Fratura sem desvio Fratura com desvio ≤ 2cm Fratura com desvio > 2cm
Pseudartrose sintomática ou Exostose dolorosa
Tabela 1 – Classificação das fraturas avulsão apofisárias de Martin e Pipkin modificada
Conclusão
O tratamento conservador da fratura avulsão isolada do pequeno trocânter é considerado o gold standard , estando associado a excelentes resultados clínicos e de retorno desportivo ao nível competitivo prévio . A indicação cirúrgica neste tipo de lesão é controversa reservando-se habitualmente para os casos em que o desvio fragmentário é superior a 2-3cm ou para o tratamento tardio da sequela dolorosa .
Bibliografia
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